27 de agosto de 2024

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Milhares de pessoas em toda a África foram infectadas com o vírus mpox, resultando em centenas de mortes e na disseminação contínua da doença. Em resposta, mais de 55 grupos de saúde pediram ao governo britânico que apoiasse os sistemas de saúde nos países afetados.

Em uma carta divulgada em 23 de agosto, os grupos exigem a rápida distribuição de vacinas para países da África que atualmente enfrentam dificuldades para responder ao surto, além de garantir o compartilhamento de tecnologias entre os atuais produtores e fabricantes de vacinas na África para aumentar o fornecimento global.

Situação terrível na RDC

Elia Badjo, médico e especialista em saúde global da COSAMED, uma associação de provedores de saúde na República Democrática do Congo (RDC), está entre os signatários da carta. Em uma conversa com o People's Health Dispatch, Badjo detalhou os desafios que o país enfrenta devido ao surto de mpox, incluindo escassez de vacinas e capacidades de teste.

Falando de Kivu do Sul, uma das regiões mais atingidas pela crise, o Dr. Badjo destaca que os profissionais de saúde só conseguem confirmar cerca de metade dos casos suspeitos por meio de testes. Ele enfatiza que, sem capacidades de teste adequadas, os socorristas não conseguem determinar com precisão o verdadeiro número de infecções.

Mesmo sem confirmação completa, sabe-se que aproximadamente 95% dos casos de mpox neste surto estão na RDC. O país relatou cerca de 14.000 casos e 500 mortes, enquanto luta contra o acesso desigual ao tratamento. Em Kivu do Sul, apenas 11 das 29 zonas de saúde afetadas têm capacidade de tratamento e muitas não têm instalações de isolamento adequadas. O rastreamento de contatos continua sendo um "verdadeiro desafio", como o Dr. Badjo destacou em uma declaração que acompanha a carta aberta.

A RDC foi fortemente afetada por surtos anteriores de mpox, incluindo o de 2022, que foi declarado uma emergência de saúde pública de interesse internacional pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Quando a OMS declarou o fim daquele surto global em 2023, as infecções ainda estavam circulando na RDC, mas nenhum plano foi feito para se preparar para o ressurgimento atual, diz Mohga Kamal-Yanni, Co-líder de Políticas da People's Medicines Alliance.

O Dr. Badjo observa que, embora a RDC tenha desenvolvido anteriormente um plano nacional para lidar com a mpox, ela teve dificuldades com uma implementação consistente. Traduzir lições de surtos passados ​​em políticas eficazes tem sido desafiador, no mínimo. No entanto, o Dr. Badjo acredita que há medidas de curto e médio prazo que podem melhorar a resposta, como expandir os esforços de mobilização da comunidade. “A resistência da comunidade deve ser fomentada e fortalecida”, ele enfatiza.

Problemas persistentes com a disponibilidade da vacina

Um grande problema é a disponibilidade limitada de vacinas, que são produzidas por apenas alguns fabricantes privados e vendidas principalmente para países de alta renda por cerca de US$ 100 por dose. A maioria dessas vacinas acaba nos Estados Unidos e na Europa, ignorando regiões como a África, onde a mpox é uma realidade há décadas. Em surtos graves, esses países normalmente doam uma pequena parte de suas reservas para regiões afetadas, deixando uma lacuna significativa na acessibilidade à vacina.

A situação atual é semelhante. O Japão prometeu 3 milhões de doses de vacina para a resposta à mpox, enquanto os Estados Unidos e países europeus comprometeram dezenas de milhares de doses. No entanto, isso está muito aquém do que é necessário. A RDC sozinha estima que precisa de 4 milhões de doses para seus esforços de resposta, enquanto o Africa Centers for Disease Control and Prevention (Africa CDC) projeta que 10 milhões de doses são necessárias para lidar com o surto atual.

Mesmo que todas as capacidades de produção existentes fossem totalmente dedicadas à entrega de vacinas onde elas são urgentemente necessárias, um déficit significativo provavelmente permaneceria. Recentemente, a produtora existente Bavarian Nordic anunciou que poderia produzir até 10 milhões de doses — mas apenas até o final de 2025.

Neste contexto, a carta argumenta que descentralizar a produção é essencial. “Cada dia conta quando se trata de emergências de saúde pública; trata-se de atender à demanda o mais rápido possível para evitar a disseminação da doença. Se os fabricantes no continente puderem fazer doses, vocês atenderão à demanda mais rápido”, diz Jake Atkinson, Consultor Sênior de Campanhas e Mídia da STOPAIDS.

“A longo prazo, precisamos apoiar a produção local de ferramentas de saúde em todas as partes do mundo, caso contrário, não teremos capacidade de responder a futuras pandemias ou emergências.”

Lançar a produção de vacinas na África exigiria um esforço significativo, explica Kamal-Yanni. O sucesso dependeria de os fabricantes atuais concordarem com transferências de tecnologia, incluindo conhecimento e infraestrutura física, e garantir que as empresas locais recebam suporte financeiro e logístico suficiente. Com essas condições atendidas, há produtores na África capazes de assumir a tarefa, afirma Kamal-Yanni.

Os problemas vão além do acesso às vacinas

Os países africanos que lutam contra a mpox enfrentam desafios além da escassez de vacinas, incluindo logística de cadeia fria enfraquecida e capacidades de teste limitadas. Atkinson ressalta que, embora essas questões sejam complexas, há medidas que países de alta renda, como o Reino Unido, podem tomar para ajudar a resolvê-las.

“Muitos países estão gastando mais em pagamentos de dívidas do que seus próprios orçamentos de saúde pública, o que é totalmente insustentável. Os países devem apoiar a reestruturação da dívida e, quando possível, o cancelamento da dívida para que as nações de baixa e média renda invistam em seus próprios sistemas de saúde”, ele diz.

Kamal-Yanni destaca que abordar as causas raiz desses problemas requer colaboração entre governos do Sul e do Norte Global. Ela enfatiza que a assistência médica deve se tornar uma prioridade global com financiamento apropriado de longo prazo, particularmente para sistemas de saúde e agências como a OMS e o Africa CDC. Embora a vigilância seja amplamente discutida, ela observa que muitas vezes é desconsiderado que a vigilância de saúde eficaz exige pessoal qualificado e equipamento adequado, o que requer financiamento dedicado.

Referências

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Fontes

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  • ((en)) Ana Vračar. Scale up Mpox response, health groups urge — Peoples Dispatch, 23 de agosto de 2024