5 de dezembro de 2020

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Uma polêmica incendiou as redes sociais – e a imprensa – no dia 19 de outubro passado, quando o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, fez uma coletiva de imprensa especial para relatar que a substância nitazoxanida, usada como vermífugo, ajudava “na redução da carga viral para tratamento precoce da Covid-19”. A controvérsia se deu devido o uso de um gráfico falso – era uma imagem da internet – que Pontes depois explicou com: "o gráfico da apresentação era meramente ilustrativo".

Além disto, no mesmo dia também faltaram informações sobre o assunto, já que nenhum relatório com dados e números havia sido apresentado.

No dia 24 subsequente, o Ministério realizou uma coletiva de imprensa, com a participação da coordenadora da pesquisa, a médica e professora da UFRJ Patrícia Rocco, que deu mais detalhes sobre o estudo, apresentando gráficos reais. Ela enfatizou, no final do evento, que: “não sei, no momento, se esta medicação, é a ‘bala de prata’ para curar a Covid-19, mas posso dizer que ela pode reduzir o número de pacientes sintomáticos após sete dias de tratamento e reduz a carga viral”.

No entanto, no dia 09 de novembro, o website especializado em Farmácia, Panorama Farmacêutico, reportou sobre a pesquisa que seu "resultado é contestado pela comunidade científica, especialmente por não ter sido publicado em periódico acadêmico e por haver algumas brechas no estudo”. O Panorama também reportou que “segundo dados do sistema Covid-NMA, em que são registrados projetos de pesquisa de todo o mundo, ainda não foi publicado qualquer estudo com a nitazoxanida envolvendo pacientes”.

Porém, numa consulta ao Covid-NMA hoje, a Wikinotícias pode constatar que, sim, há um estudo registrado, com dados atualizados pela última vez em 13 de novembro de 2020. No texto chamado Early use of nitazoxanide in mild Covid-19 disease: randomized, placeboc ontrolled trial (Uso precoce de nitazoxanida na doença de Covid-19 leve: randomizado, placebo-ensaio controlado), que tem entre seus autores Patrícia Rocco e que foi publicado também no medRxiv, há indicativos de que, comparado ao grupo de placebo, o grupo que usou nitazoxanida conseguiu uma diminuição da carga viral após 7 dias de uso do medicamento.

O estudo

Diversos hospitais brasileiros participaram do estudo. 392 pessoas adultas com Covid-19 leve e precoce confirmada foram divididas em 2 grupos, sendo que 194 usaram nitazoxanida e as demais tomaram placebo durante 7 dias.

Os resultados indicaram, em “Discussão” que a “nitazoxanida não alcançou o desfecho primário em pacientes com Covid-19 leve quando avaliados após 5 dias de terapia, mas quando avaliado após uma semana, 78% do grupo da nitazoxanida e 57% do grupo do placebo relataram resolução completa de sintomas [o que significa que 20% a mais das pessoas que usaram a nitazoxanida conseguiram a resolução da Covid – dado foi considerado “significativo” por Patrícia na coletiva]. Consistente com os dados in vitro, observamos reduções na carga viral após um curso de 5 dias de nitazoxanida em pacientes com Covid leve. Este efeito pode ter impacto epidemiológico, potencialmente diminuindo a transmissão do SARS-CoV-2, a morbidade e a mortalidade”.

O texto divulgado no medRxiv enfatiza em “Leve esta mensagem para casa” que “a nitazoxanida não acelerou a resolução dos sintomas após 5 dias de terapia; no entanto, reduziu a carga viral significativamente, sem eventos adversos graves”.

Problemas

Conforme o estudo em “Discussão”, “apenas pacientes com Covid-19 leve foram incluídos; a maioria eram adultos jovens (com idades entre 18-39), poucos tinham comorbidades (12-18%) e o uso de medicamentos concomitantes não era frequente (menos de 20% da amostra). Novos estudos são necessários para avaliar se a nitazoxanida pode desempenhar um papel em pacientes com Covid-19 grave, com o objetivo de reduzir a carga viral e mitigar os sintomas”.

Outra limitação apontada é que “uma análise de longo prazo dos efeitos da terapia (por exemplo, além de 28 dias) não foi realizada” e que apenas pacientes com estes três sintomas (tosse seca, febre e fadiga) foram analisados.

Pesquisadora-chefe não recomenda uso

Após dias de polêmicas, no início de novembro Patrícia disse que: "jamais sugeri o uso da nitazoxanida em qualquer paciente ou em qualquer fase da Covid-19. Entretanto, é importante fomentar a discussão na comunidade científica nacional e internacional."

O medRxiv

O medRxiv (pronuncia-se "med-archive") é um servidor de uso gratuito para o registro de manuscritos completos, mas ainda não publicados (chamados preprints), sobre temas relacionados à Medicina e Saúde em geral.

O servidor é uma iniciativa de Mark Zuckerberg e sua esposa, Priscilla Chan.

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Fontes