Antropólogo Brito-Semedo analisa cultura das ilhas em 40 anos de independência.
5 de julho de 2015
"Mon pays est une musique", é uma morna eternizada por Cesária Évora em todo o mundo que diz muito de Cabo Verde. O arquipélago é conhecido pela sua música, tanto produzida no país como na diáspora, mas a cultura cabo-verdiana é muito mais do que morna, coladeira, funaná, batuco, colá, bandeira e demais géneros musicais.
Estudiosos da literatura cabo-verdiana lembram que o primeiro grito de independência da Nação cabo-verdiana foi o movimento literário Claridade e outros que se seguiram.
Nestes 40 anos de independência, a literatura cabo-verdiana cresceu muito, mas continua a debater com a falta de promoção e o reduzido mercado nacional.
O professor universitário e antropólogo Manuel Brito-Semedo considera haver "um momento de viragem do regionalismo mais europeu da Claridade ou mais africano dos anos 1950-56, começa a haver uma orientação da literatura mais universalista" .
Corsino Fortes e João Varela são, para Brito-Semedo, os responsáveis dessa mudança que marcou a literatura das ilhas.
Desde então, segundo Brito-Semedo, "a literatura conheceu um crescendo de aumento de qualidade, mas não tanto de quantidade".
Os destaques vão para Arménio Vieira, o primeiro cabo-verdiano a ganhar um prémio internacional de peso, Prémio Camões, e Germano Almeida, o mais produtor escritor das ilhas são os destaques
Mas há outros valores que se despontam nas ilhas e que continuam a dar uma visão mais universalista à literatura cabo-verdiana.
O antropólogo Brito-Semedo cita, entre outros, o poeta José Luis Tavares, também muito premiado em Portugal e no Brasil, bem como José Luís Hopffer Almada e Filinto Elísio, este último agora mais dedicado à edição.
Numa análise rápida a esse período,aquele professor destaca ainda novos valores, como Margarida Fontes, "num universo onde há poucas mulheres, com destaque para Vera Duarte, "já consagrada".
A literatura cabo-verdiana, também, continua a suscitar interesse de universidades portuguesas, brasileiras e americanas, com teses de mestrados e doutoramentos, enquanto no arquipélago, ainda essa actividade é incipiente por não haver muitos especialistas na área.
Apesar desse avanço, muito reconhecido, o Estado tem sido fortemente criticado por em 40 anos de independência não ter tido política de promoção da cultura. O escritor Germano Almeida colocou o dedo na ferida esta semana, e o também escritor Brito-Semedo é crítico nesta área.
"O Estado não tem tido um papel de promotor contínuo da literatura, não há prémios, não há incentivo à leitura, aliás, há uma clara omissão do Estado nesta área", acusa o também escritor que "atribui esse crescimento à iniciativa dos privados, dos próprios fazedores da literatura".
Quanto às outras áreas, o teatro tem tido um desenvolvimento extraordinário no país, principalmente devido à intervenção dinamizadora de João Branco, em S.Vicente, o polo de desenvolvimento do teatro, que, para Brito-Semedo, é área mais pujante da cultura nos últimos 40 anos.
A nível das artes plásticas, Brito-Semedo fala de uma resistência cultural logo por altura da independência, que deu frutos, ao ponto de haver galerias e artistas que começam a ganhar espaço no país e no exterior.
Enretanto, a música é, sem dúvida, o grande cartão postal de Cabo Verde, com Cesária Évora, assumir-se como a grande embaixadora do arquipélago. Évora, que teve o seu ponto máximo, ao conquistar um prémio Grammy, o mais importante reconhecido da música mundial.
Antes, no entanto, Bana e a Voz de Cabo Verde levaram as ilhas à Europa e África.
Logo após a independência os Tubarões se afirmaram como o mais importante agrupamento cultural de Cabo Verde.
A morna e a coladeira foram, através dos anos, os dois mais conhecidos géneros musicais das ilhas, mas, após a independência, emergiram outros anteriormente silenciados pelas autoridades coloniais como funaná, batuque, colá, tabanca, mazurca, bandeira, entre muitos outros.
O panorama musical cabo-verdiano enriqueceu-se nos últimos 20 anos com uma nova geração de compositores e intérpretes, que revelam uma preocupação pela recuperação de valores tradicionais com ritmos influenciados pela World Musik, zouk e outros géneros.
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Fonte
- Alvaro Ludgero Andrade. Cabo Verde: Para além da música e Cesária Évora — Voz da América, 5 de julho de 2015, 19:33
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