10 de junho de 2024

link=mailto:?subject="Estamos%20sob%20ataque":%20UNESCO%20afirma%20que%20mais%20de%2070%%20dos%20jornalistas%20ambientais%20no%20mundo%20sofrem%20agressão%20–%20Wikinotícias&body="Estamos%20sob%20ataque":%20UNESCO%20afirma%20que%20mais%20de%2070%%20dos%20jornalistas%20ambientais%20no%20mundo%20sofrem%20agressão:%0Ahttps://pt.wikinews.org/wiki/%22Estamos_sob_ataque%22:_UNESCO_afirma_que_mais_de_70%25_dos_jornalistas_ambientais_no_mundo_sofrem_agress%C3%A3o%0A%0ADe%20Wikinotícias Facebook Twitter WhatsApp Telegram

 

Mais de 70% dos jornalistas relataram ter sido alvo de ataques, ameaças ou pressões enquanto cobriam temas ambientais, segundo uma pesquisa que faz parte do relatório publicado no dia 3 de maio pela Organização das Nações Unidas para a educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) sobre a atual situação de segurança enfrentada pelos jornalistas dedicados a temas ambientais.

"Esta descoberta é muito impactante", disse Guilherme Canela, chefe da seção de liberdade de expressão e segurança de jornalistas da UNESCO, em entrevista à Voz de América em Bogotá, ao ressaltar que se trata de uma pesquisa elaborada, pela organização da ONU e pela Federação Internacional de jornalistas, com 900 jornalistas de 129 países em todas as regiões do mundo.

"É algo absolutamente grave que temos que fazer toda a ênfase possível para dizer aqui há um problema sério que tem que ser enfrentado", acrescentou.

Seus comentários chegam no contexto do Dia da Liberdade de imprensa, que este ano é dedicado pela ONU ao debate global sobre a importância do jornalismo e da liberdade de expressão no contexto da atual crise ambiental mundial, e que será discutido entre 2 e 4 de maio, no Chile.

Além da pesquisa, o novo estudo da UNESCO, que faz uma análise quantitativa e qualitativa dos ataques contra jornalistas que cobrem o meio ambiente, inclui dados de profissionais assassinados e um estudo da organização sobre os ataques cometidos contra esses comunicadores, nos últimos anos.

De acordo com a pesquisa, dos jornalistas que relataram ter sido alvo de ataques enquanto cobriam questões ambientais, 41% sofreram agressões físicas e 60% relataram ter sido alvo de assédio on-line, enquanto um quarto disse que foram legalmente atacados. 75% dos jornalistas atacados observaram que isso afetou sua saúde mental e quase 50% relataram ter que praticar a autocensura.

Da mesma forma, mais de 80% das mulheres que relataram ter sido vítimas de ataques enquanto informavam sobre questões ambientais, receberam ameaças psicológicas ou pressões.

Os principais atacantes

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A parte do estudo que analisa os ataques nos últimos anos aponta que estes aumentaram em 42 % nos últimos cinco anos (mais de 300 ataques), um aumento que se atribui ao aumento de agressões físicas, prisões e assédio, e a ações legais que incluem processos por difamação e processos penais e que se pode dever a três hipóteses, segundo Canela: a maior cobertura do tema ambiental, a melhoria do monitoramento do mesmo e o aumento dos crimes digitais.

O porta-voz explicou à VOA que a investigação demonstra que a maioria dos ataques provém de atores estatais: policiais, militares, políticos, funcionários públicos. E, em segundo lugar, estão os atores privados, isto é, os empresários e organizações ligadas ao crime organizado.

"Embora a polícia seja o principal perpetrador, há um crescente volume de ataques dos próprios manifestantes contra a imprensa", disse Canela em alusão à cobertura dos protestos. Ao mesmo tempo, insistiu que é " muito preocupante porque está correlacionado a esta narrativa contrária ao jornalismo, que vem muito de políticos, de celebridades, etc."

Canela adverte que esta tendência "pode resultar em mais violência".

Os números falam por si. O estudo da UNESCO indica que houve pelo menos 194 jornalistas e meios de comunicação atacados, enquanto cobriam protestos ambientais nos últimos 15 anos, principalmente na Europa, América do Norte e América Latina e Caribe. As forças policiais e militares são os principais perpetradores, com 89 ataques, enquanto os manifestantes representam 32 ataques.

Um problema global, América e América Latina?

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Canela ressaltou que outra das descobertas mais marcantes é" a amplitude do fenómeno", ou seja, que a violência contra jornalistas ambientais não se centra em uma só região do mundo:"todos em todos estes distintos tipos de coberturas ambientais em distintas partes do planeta, nos disseram o mesmo: estamos sob ataque e isso sim é muito grave".

Embora o funcionário tenha enfatizado que a análise elaborada tem uma perspetiva global, muitos aspetos coincidem com a situação dos jornalistas que cobrem o meio ambiente na região. Além das ameaças "que vêm do crime organizado relacionado a questões ambientais, por exemplo, a mineração ilegal ou a pesca ilegal", também existe a presença de "mais violência policial" contra os comunicadores que cobrem protestos ambientais.

O chefe da liberdade de expressão da UNESCO também ressaltou como positivo a preocupação dos jornalistas da América Latina que estão criando novos meios dedicados à cobertura de temas ambientais e à aproximação dos povos originários e da população indígena.

Impunidade em níveis elevados

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Um total de 44 jornalistas que informavam sobre temas ambientais foram assassinados nos últimos 15 anos, e apenas cinco casos resultaram em condenações, segundo o Observatório de jornalistas assassinados da UNESCO. Além disso, pelo menos 24 jornalistas sobreviveram a tentativas de assassinato.

A este respeito, Canela disse que, neste ponto, é necessário o "fortalecimento das estruturas investigativas, seja a polícia para os Serviços de Procuradoria e, depois, "as decisões que vêm do Poder Judiciário para uma melhor compreensão deste tipo de violência".

Outros elementos relacionados com a impunidade, assinalou o porta-voz da UNESCO, são as dificuldades do Estado democrático de Direito em distintos países da região e o fortalecimento de seus serviços, assim como a necessidade de que a população entenda que quando "um jornalista é assassinado em uma cidade da América Latina", a comunidade "está perdendo o direito de ser informada" e tem que demandar o "fim desta impunidade e a proteção" dos profissionais.

Recomendações da UNESCO

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O debate levantado este ano sobre liberdade de imprensa e crise ambiental , segundo Canela, responde a dois problemas paralelos que a humanidade enfrenta, mas que estão "interconectados" e que devem ser "protegidos": as liberdades fundamentais, as instituições democráticas e a proteção do planeta.

Nesse sentido, acrescentou, busca-se destacar "o trabalho dos jornalistas, que é central para colocar luz sobre o que está acontecendo do ponto de vista dos problemas ambientais", em buscar sua proteção e em como combater "os níveis absurdos de desinformação que há sobre as questões ambientais".

A UNESCO recomenda aos Estados que implementem "políticas complexas, conectadas e coordenadas" relacionadas com a prevenção, a proteção e a procuração de Justiça, de acordo com o tipo de cobertura e ataque contra os jornalistas que cobrem temas ambientais.

Ao mesmo tempo, insta a capacitar, entre outros, os atores-chave, como a polícia, os promotores, os juízes, ministérios públicos.

Quanto à desinformação relacionada à mudança climática, os entrevistados acham que ela aumentou nos últimos anos e consideram que o jornalismo não está fazendo o suficiente para combatê-la.

A UNESCO lançou ainda um conjunto de diretrizes globais que "buscam repensar a governança do ecossistema digital justamente para, por um lado, proteger a liberdade de expressão e, por outro, combater fenómenos como o caso da desinformação e do discurso de ódio", assinalou Canela.

É fundamental - disse-envolver mais as grandes empresas tecnológicas.

Por fim, a ONU exorta a sociedade a exigir proteção para o jornalismo: "isso será absolutamente central para continuar bem informado sobre vários temas, incluindo os temas centrais da proteção ambiental".