Agência Brasil

6 de fevereiro de 2018

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A União da Ilha do Governador, da zona norte do Rio, entra no Sambódromo na Segunda-Feira de Carnaval (12) com os sabores e pratos da culinária brasileira representados no enredo Brasil bom de boca. Se é para falar de comida, claro que não podiam faltar os chefes de cozinha, escolhidos após intensa procura. A premiada chefe Flávia Quaresma deu assessoria ao carnavalesco da Azul, Vermelho e Branco da Ilha, Severo Luzardo. Flávia disse que quando a notícia sobre o enredo da escola se espalhou, começaram a chegar os pedidos dos chefes para participar do desfile. E aí surgiu uma questão difícil de resolver: como arranjar lugar nas alegorias para atender tanta gente?

“Os chefes começaram a me ligar para estar nos carros e não tinha mais lugar. E eu enlouquecendo o carnavalesco, que me disse que os carros têm uma estrutura e não dava para botar mais ninguém”, contou Flávia. O jeito foi trazer um carro com vários chefes e o restante desfilará nas outras alegorias, representando a culinária da sua região.

Esta reportagem é parte da série que a Agência Brasil publica, até o carnaval, sobre os preparativos para os desfiles das escolas de samba do grupo especial do Rio de Janeiro. Confira as demais matérias.

Flávia Quaresma revelou que a animação dos chefes de fora do Rio foi tanta que eles resolveram bancar os próprios custos com passagem e hospedagem para estar no desfile da Ilha. Assim, ela conseguiu driblar a dificuldade financeira que as escolas enfrentaram este ano com cortes de recursos.

“O Claude [Troisgros], o Laurent [Suaudeau] e a Roberta Sudbrack, que moram no Rio, foi mais fácil, porque eles já estão aqui, mas são 18 estados representados. Todos [os chefes estão] vindo por conta própria, pagando passagem e estadia. Eu falei: só garanto a diversão e o momento único na vida de vocês”, informou.

Emoção

Para a dona de um restaurante carioca, a experiência de desfilar em escolas de samba não é nova, mas este ano, Flávia quase desmaiou de emoção, quando o carnavalesco disse que a gastronomia brasileira ia ser o enredo da Ilha. Atravessar a avenida dos desfiles, agora, será diferente, porque o enredo é a gastronomia, algo que lhe dá muito prazer.

“Tantos anos que a gente ficou esperando para ver se alguém ia falar da gastronomia. A primeira reunião que a gente teve foi aqui no barracão [da Cidade do Samba] e eu enlouqueci. Já tinha a estrutura dos carros e o Severo me deu uma aula de como estava interpretando na avenida a gastronomia. Fiquei arrepiada, ele lembrou de tudo com tantos detalhes!”, revelou, aprovando o trabalho do carnavalesco.

Setores

A primeira parte do enredo vai mostrar os produtos que vieram de fora, com a chegada da corte portuguesa ao Brasil. A partir daí, as influências dos portugueses e seu país de origem se misturam com os alimentos que encontraram por aqui, como o milho, o caju e a pimenta usada pelos indígenas. A influência dos nativos da América na culinária brasileira estará representada no segundo setor do enredo. “O pato no tucupi é uma comida indígena que está até hoje no prato do brasileiro, [assim como] o tacacá. São coisas da culinária indígena”, explicou Severo Luzardo.

Para a ala de baianas, o carnavalesco reservou um toque especial. Elas estarão vestidas em alusão à pacova da terra. “Em uma das cartas de Pero Vaz de Caminha de volta para Portugal ele descreve que encontrou aqui no Brasil uma espécie de banana que os nativos chamavam de pacova, que era pequena e sem gosto. Ok, mas era a nossa culinária e até hoje, na região Norte, se encontra pacova na feira e nas receitas está escrito pacova. Isso é bacana, é nossa culinária”, indicou. Em algumas regiões a pacova também é chamada de pacoba ou pacovã.

O terceiro setor vai mostrar a influência dos negros que vieram para o Brasil e dos seus pratos que se tornaram comuns na gastronomia do país, como a feijoada e o acarajé. “Nos ensinaram muitas coisas e, sobretudo, botaram o tempero na culinária brasileira. Até então, a culinária da corte era muito insossa”, pontuou, acrescentando que as fantasias dos ritmistas da bateria farão referência aos cozinheiros negros.

No quarto setor, a escola vai fazer uma crítica de que apesar de produzir e exportar grande quantidade de alimentos, parte da população brasileira ainda sofre com a fome. “Deveria ser o contrário. A gente produz o alimento para o mundo. Nós deveríamos ser uma nação fortíssima. Sabemos produzir, temos pesquisas tecnológicas. Não temos é uma administração”, apontou Luzardo, sem entrar no viés político do tema.

Na sequência, com o cacau, a escola vai mostrar a alegria dos doces, uma homenagem às avós que fazem os bolos caseiros, comuns na lembrança de muitas famílias. O setor vai apresentar, ainda, algumas das preferências dos brasileiros, incluídas até em listas de turistas que chegam ao país. “Invariavelmente tem a coxinha de galinha, a caipirinha, o açaí e o pão de queijo, que hoje é exportado. A gente vai mostrando para o mundo que temos peculiaridades”, disse o carnavalesco.

O desfile termina com um grande boteco – na visão de Luzardo, uma instituição no país. “O brasileiro vai lá para comer, para beber, conversar, falar de política, de carnaval, de futebol, de tudo, antes de ir para a casa. É uma instituição em que a comida nos agrega. É a gastronomia brasileira sendo bem representada”, acrescentou.

Descontração

O carnavalesco destacou que o enredo vai permitir que a Ilha se apresente leve e com muita evolução, o que caracterizou vários desfiles da escola na avenida. E isso empolgou os componentes. Antes de definir os figurinos das alas, o carnavalesco teve o cuidado de mostrar e conversar sobre os protótipos das fantasias com os integrantes. “Está todo mundo feliz. Não tenho reclamação”, pontuou.

Com tanta comida representada na avenida, a chefe Flávia Quaresma avaliou que a fome no desfile da Ilha será apenas a do título de campeã, já que o menu começou a ser preparado. “Tem o pré-carnaval que os chefes já estão organizando. Como vem muita gente de outros estados, já tem gente perguntando onde vai se reunir, em que boteco, para experimentar as coisas do Rio, que muitos já conhecem, mas tem muita novidade [na comida], graças a Deus. Para a avenida, a gente está pensando o que vai levar e tem o pós-carnaval, que já está programado. Agora, a fome mesmo com que a gente vai entrar [na avenida] é uma fome enorme de título e a vontade absurda de vencer”, disse Flávia, acreditando no campeonato.

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