18 de dezembro de 2024

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A raia-chita (Aetobatus narinari), conhecida por seu dorso azul-escuro com manchas brancas, habita as águas tropicais do Oceano Atlântico, e é particularmente comum no Sudeste e no Sul do Brasil. Um artigo científico publicado na revista Ocean and Coastal Research traz novidades sobre o comportamento de acasalamento da espécie, também conhecida como raia-pintada, na costa do Brasil. Pela primeira vez, pesquisadores documentaram o cortejo e o acasalamento da raia-chita em águas brasileiras.

A descoberta ocorreu na zona de exclusão marinha do entorno do Parque Estadual da Ilha Anchieta, uma área protegida na costa norte de São Paulo, e abre caminho para novas investigações sobre a biologia e a preservação desses animais. A bióloga Thamíris Christina Karlovic de Abreu, pós-doutoranda do Instituto Oceanográfico (IO) da USP, lidera o estudo ao lado do oceanógrafo Lucas Citele Candido e da professora June Ferraz Dias, coordenadora do Laboratório de Ecologia da Reprodução e do Recrutamento de Organismos Marinhos do IO.

De acordo com Thamíris, até recentemente, a A. narinari era considerada uma espécie cosmopolita, mas estudos mostraram que ela é predominantemente encontrada no Atlântico. “Este é o primeiro registro científico do comportamento reprodutivo e do acasalamento de que se tem conhecimento na costa do Brasil. Há registros na região da Oceania e em aquários, mas na costa do Brasil ainda não tínhamos nenhum registro reportado”, esclarece a pesquisadora.

Com uma longa cauda que pode lembrar um chicote, a raia-chita se alimenta principalmente de crustáceos e outros pequenos animais, utilizando a estratégia de enterrar metade do corpo na areia para capturar suas presas. Apesar de sua beleza e comportamento curioso, o estudo desses organismos tem sido um desafio para os cientistas. “Há registros de cópula e corte em outras espécies do gênero Aetobatus, mas, até agora, não tínhamos nenhuma documentação científica na costa brasileira”, pontua a pesquisadora.

O comportamento observado, raro em ambientes naturais, foi registrado graças à tecnologia e ao trabalho de voluntários no projeto Mergulhando na Conservação. A raia-chita é relativamente tímida e dificilmente se aproxima de banhistas, fato que surpreendeu as especialistas. “No segundo registro de cortejo, o comportamento aconteceu no meio dos banhistas”, conta ela.

O Parque Estadual da Ilha Anchieta, adjacente ao local onde as raias foram observadas, possui uma zona de exclusão marinha que proíbe a pesca em seus arredores. Segundo a professora June Ferraz, essa proteção é essencial para a manutenção do ecossistema. “Proteger uma área onde ocorre a reprodução dessa espécie vulnerável significa garantir um futuro saudável para toda a comunidade marinha da área e não somente para essa espécie”, afirma. A exclusão de atividades humanas, como a pesca de arrasto, ajuda a reduzir a degradação do ambiente, barulho e poluição, fatores que poderiam impactar a biodiversidade local.

No parque, o projeto Mergulhando na Conservação, liderado por Thamíris e Lucas, usa a ciência cidadã para engajar turistas e voluntários na proteção da raia-chita. “Com a atividade Seja Cientista por um Dia, fazemos mergulhos guiados onde os participantes ajudam a coletar dados sobre as espécies que avistam”, explica ela. As informações reunidas são essenciais para o monitoramento da raia-chita e de outras espécies que habitam a região.

Além de promover a sensibilização ambiental, o projeto também permite que os voluntários participem ativamente das pesquisas científicas. Para a bióloga, “a sociedade precisa ser ouvida, porque o cientista não pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo. A ciência cidadã é uma ferramenta valiosa para aproximar as pessoas da conservação, sendo protagonistas das pesquisas”.

A partir de agora, a expectativa das cientistas é que os registros e a relevância do entorno da Ilha Anchieta para o comportamento reprodutivo das raias-chita possam fortalecer a demanda pela criação de uma Unidade de Conservação que integre a área terrestre e a marinha por suas características naturais relevantes. Nesse contexto, o estudo reforça a urgência de proteger áreas marinhas e definir ações para a conservação como, por exemplo, o fortalecimento da proteção de áreas utilizadas em atividades essenciais para a manutenção de espécies ameaçadas. A raia-chita, que está entre as espécies vulneráveis, depende de ambientes como o entorno da Ilha Anchieta para sobreviver e se reproduzir.

Na opinião da professora June, quanto mais dados forem coletados sobre as peculiaridades desse ambiente, teremos mais argumentos para garantir a defesa da região, “tudo que pudermos mostrar de evidências científicas e particularidades da área será importante para sua proteção”, finaliza.

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