5 de junho de 2024
São Paulo viveu um movimento histórico na eleição municipal de 2020. Quatro mulheres negras foram eleitas vereadoras — em 72 anos, a capital paulista elegeu apenas seis vereadoras negras, no total.
A proporção entre os 55 vereadores da Câmara municipal da cidade, a maior do Brasil, no entanto, ainda está abaixo da representação da população. Em São Paulo, a cada 10 vereadores, duas são mulheres eleitas. Quando se leva em consideração toda a região metropolitana, a média cai para uma vereadora a cada dez parlamentares nas Câmaras municipais.
Olhando para as prefeituras municipais, a situação parece ainda mais delicada – apenas 3 das 39 cidades da Grande São Paulo têm mulheres prefeitas.
De acordo com a plataforma TSE Mulheres, do Tribunal Superior Eleitoral, as mulheres compõem mais da metade (52%) do eleitorado no Brasil. No entanto, o número de votos obtidos por candidaturas femininas foi de 33%, sendo 15% delas eleitas, entre 2016 e 2022.
A poucos meses de uma nova eleição nos 5.565 municípios brasileiros, a Agência Mural ouviu vereadoras, líderes comunitários e especialistas sobre por que é tão difícil para mulheres, em especial as periferias, entrarem na política institucional. E também sobre as trajetórias daquelas que chegaram ao Legislativo.
Movimento de mudança Antiga moradora do Grajaú, zona sul de São Paulo, Sem vereadoras Entre as eleições locais de 2016 e 2020, as cidades da região metropolitana viram o número de vereadoras crescer, apesar de timidamente: com 71 mulheres eleitas, o aumento foi de 26%. O que representa apenas 10% do total de cadeiras nas Câmaras de 39 cidades da região.
O município de Cotia não elege mulheres desde os anos 1980. Dez municípios atualmente não contam com nenhuma parlamentar mulher, mesmo com mais da metade da população sendo composta por elas.
Com quase meio milhão de habitantes, Mauá, é uma dessas Câmaras sem mulheres.
Maria Clara Ribeiro, 20 anos, é uma jovem artista engajada na política e moradora do bairro do Cerqueira Leite, na periferia da cidade. Ela faz parte da UP (Unidade Popular) e do Movimento de Mulheres Olga Benário, que atua principalmente com vítimas de violência doméstica e organiza mulheres politicamente para que elas conheçam seus direitos.
Na cidade, a Casa Helenira Preta, onde Maria atua, é uma das ocupações que abriga mulheres e fornece apoio elas. Sendo uma mulher negra e periférica, Maria ressalta que a representatividade é importante, mas o acesso das mulheres em situação de vulnerabilidade às Câmaras Municipais ainda é muito difícil.
Para Shisleni de Oliveira Macedo, pesquisadora do Centro de Estudos Periféricos da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), entre as barreiras para que mulheres periféricas participam de ativismo, estão sexismo e capitalismo.
“Uma pessoa trabalha 8, 10, 12 horas por dia e leva duas horas para ir e duas horas para voltar, é difícil também que ela se engaje enquanto ativista política”, explica.
“Ela precisa encontrar tempo, espaço na vida. Lembrando que as mulheres também têm outras jornada. São elas que cuidam das crianças, das pessoas idosas, cuidam inclusive das coisas para os homens entrarem na política”, ressalta.
”Os partidos políticos têm um papel importante. Se os partidos não priorizarem a inclusão de mulheres nas listas de candidatos ou não oferecerem apoio significativo, a representação feminina na política de continuação baixa”.
Pela lei brasileira, partidos precisam apresentar 30% de candidaturas femininas e também encaminhar a mesma proporção do fundo eleitoral para campanhas delas.
- As raras prefeitas
Candidatas a prefeitas também enfrentam dificuldades. Poá é um dos raros municípios da Grande São Paulo com uma mulher no comando, a prefeita Márcia Bin, eleita em 2020 com 23.446 votos, a primeira no município de 103 mil pessoas.
Na urna eletrônica, o nome da candidata apareceu de forma peculiar: Márcia Bin ”Esposa do Testinha”, apelido de Francisco Pereira de Sousa, ex-prefeito da cidade.
Em 2009, ”Testinha” nomeou a esposa para o cargo de secretária de Promoção Social. Ambos foram condenados por improbidade administrativa. Em 2022, o STF (Supremo Tribunal Federal) anulou as condenações, mantendo a prefeita no cargo.
A relação do casal no registro da candidatura foi alvo de críticas. “De forma alguma representa o que falamos como representatividade da mulher na política. Muito pelo contrário, isso representa o que o machismo estrutural faz com as mulheres na política”, comenta Gisele Magalhães, 40 anos, professora e representante do Fórum Permanente de Cultura de Poá.
Ela diz acreditar que a representação política da mulher deve ir além, elegendo aquelas que de fato lutem por essa causa no município, com projetos, leis e fiscalizando questões como vagas disponíveis em creches, atendimento à saúde e casos de violência de gênero., 30 anos, é educadora popular e trabalhadora da saúde. Foi eleita na capital paulista com 37.550 votos e levou ao mandato pautas que já faziam parte da vida pessoal dela.
“Entendo que faço parte de um movimento histórico de mudança de mundo. As coisas não mudam de uma geração para a outra. Existem acúmulos de processos para romper com o sistema”, conta a vereadora Luana.
Fontes
editar- ((es)) ¿Dónde están las mujeres de la periferia en la política brasileña? — Global Voices, 4 de junho de 2024
Esta notícia é uma transcrição parcial ou total do Global Voices. |