9 de março de 2005

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Depois de anunciar que iria renunciar na noite de domingo, 6 de março, o Presidente da Bolívia Carlos Mesa oficializou de fato a sua renúncia às 11 horas e 15 min (15:15 UTC), perante o Congresso Nacional do país. Depois de aceitar a renúncia, Hormando Vaca Díez, presidente da Câmara de Senadores, assumiu como Presidente da República interino.

Mesa disse:

Não posso continuar a governar sendo ameaçado por um bloqueio nacional que estrangula o país, por ultimatos, greves, ameaças e ações, que não fazem outra coisa a não ser destruir o nosso aparato produtivo, nossa confiança, nosso futuro. (...) A posição de algumas das mais importantes figuras da política boliviana e de algumas organizações sociais regionais e sindicais estão levando a Bolívia a um ponto de confrontação que põe em risco, a meu entender, nosso futuro e nossa viabilidade.

A renúncia de Mesa foi motivada pelo anúncio do bloqueio de estradas no país feito por Evo Morales, líder dos plantadores de coca e do partido político Movimiento al Socialismo (MAS), formado por plantadores de coca (cocaleros), comunistas, admiradores de Fidel Castro e grupos indígenas radicais. O objetivo do grupo é pressionar o legislativo para aprovar a Lei de Hidrocarbonetos, que é considerada inconveniente pelo governo boliviano. A lei prevê um aumento de 18% a 50% nos impostos sobre hidrocarbonetos.

Segundo declaração de Mesa, feita momentos antes da sua renúncia:

A Lei de Hidrocarbonetos que é planteada pelo honorável Evo Morales, chefe do MAS, é uma lei inviável e impossível. Quero ressaltar o que estou dizendo, é uma lei inviável e impossível.

O MAS é um partido político assumidamente contra os Estados Unidos da América, a globalização e o neoliberalismo. Nas palavras do próprio Morales:

O pior inimigo da humanidade é o capitalismo. É ele que provoca levantes como os nossos, a rebelião contra um sistema, contra o modelo neoliberal, que é a representação de um capitalismo selvagem. Se o mundo inteiro não reconhece esta realidade, que os estados nacionais não estão a prover as condições mínimas de saúde, educação e alimentação, então, a cada dia, os direitos mais fundamentais do ser humanos estão a ser violados.

A Bolívia depende quase que completamente da sua exportação de hidrocarbonetos que tem em abundância, principalmente gás (a segunda maior reserva de gás da América Latina). O cultivo de coca também contribui, de forma legalmente questionável, para as finanças do país. Os plantadores de coca exigem cada vez mais a mesma atenção que o governo dá para a produção de hidrocarbonetos.

O plantio da coca em alta quantidade é problemático, visto que essa planta é também a matéria-prima da cocaína, uma droga considerada ilegal na Bolívia e na maioria dos outros países. Atualmente a Bolívia é o terceiro produtor mundial de coca. Produtos derivados da coca e cocaína são exportados para mercados de drogas no Brasil, Chile, Argentina, União Europeia e EUA. O governo boliviano tenta reduzir a produção de coca com programas alternativos, mas enfrenta grande resistência por parte de alguns plantadores.

As maiores exportações de gás da Bolívia vinham sendo feitas para o Brasil. Recentemente, o Brasil reduziu suas importações para aumentar o superávit em sua balança comercial. Além disso, grandes jazidas de gás natural foram descobertas em território brasileiro, o que faz com que o gás boliviano não seja tão necessário.

Mapa da Bolívia.

Os EUA têm interesse no gás boliviano. Todavia, o MAS se opõe à exportação de hidrocarbonetos para os norte-americanos e diz que isto serviria apenas para enriquecer aquele país e suas multinacionais. Existe também um outro problema relacionado à exportação. Para disponibilizar o seu gás para compradores estrangeiros, é necessário ter um gasoduto que chegue até o Oceano Pacífico. A Bolívia não tem acesso direto ao oceano, e os únicos caminhos possíveis são através do vizinho Peru ou Chile, que oferece o caminho mais curto e viável. A passagem pelo território chileno é delicada, tendo em vista que a Bolívia já entrou em guerra com o Chile pelo controle do Corredor de Atacama, uma faixa de território que oferece uma passagem para o Pacíifico e que a Bolívia cedeu ao Chile em 1884.

Em outubro de 2003, Morales provocou a renúncia do então Presidente Gonzalo Sánchez de Lozada, ao promover manifestações em todo o país, que resultaram na morte de aproximadamente 80 pessoas. Após a renúncia de Lozada, Mesa, que era o vice-presidente, assumiu o comando do governo boliviano.

Sobre a renúncia de Mesa, Morales disse:"A renúncia ocorreu apenas para chantagear, uma renúncia que não vai levar a nada, uma renúncia que fundamentalmente serve para que não ocorra a agenda de outubro [com a finalidade de nacionalizar o gás e proclamar um assembléia constituinte]."

Morales é um admirador de Fidel Castro e diz-se inspirar nos presidentes da Venezuela Hugo Chávez e Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva. Ele apóia a formação de um bloco anti-imperialista contra os EUA que está a ser organizado pelo presidente brasileiro e que reúne países árabes e latino-americanos [1].

Bloqueios de estradas aconteceram em dois lugares estratégicos: na cidade de El Alto, vizinha à capital, e na localidade de El Chapere, no meio da estrada que liga as cidades de Cochabamba e Santa Cruz de la Sierra. Na primeira cidade, com o propósito de pressionar para a saída do Grupo Suez, uma multinacional francesa encarregada da distribuição de água por causa das alegadas altas tarifas, e também para pressionar pela intervenção na companhia Aguas del Illimani.

O país está dividido e acontecem vários protestos e manifestações a favor e contra Mesa.

Fontes

Nota: Atualizado em 10 de junho de 2005 por Carlosar. Removida figura ausente:"Bolivia.CarlosMesa.02.jpg", corrigida a redação da palavra Bolívia (Bolíiva -> Bolívia) e acrescentada a categoria "Crise na Bolívia".. Para maiores informações veja o histórico.