Agência VOA

25 de dezembro de 2022

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Valentina*, 27 anos, deixou Carabobo, na Venezuela, há quatro anos, porque o dinheiro era insuficiente em casa. Agora mora na Colômbia, na cidade fronteiriça de Cúcuta, e, embora não seja profissional, conhece e gosta de informática, apesar de não ter conseguido pagar a faculdade. Para sobreviver, dedica-se à reciclagem na rua - recolher resíduos ou entulho para uso posterior - e à atividade sexual. Como ela, muitas migrantes venezuelanas trabalham como prostitutas na Colômbia “como único meio de sobrevivência”, o que, segundo Jaime Valencia, diretor da organização Aid for Aids, é chamado de “sexo para sobrevivência”.

De acordo com um estudo elaborado entre 2021 e 2022 por esta organização, juntamente com o programa USAID Connecting Paths for Rights, 92,6% das profissionais do sexo entre os 18 e os 25 anos não estão associadas a nenhum serviço de saúde, correndo assim o risco de contraindo uma doença grave devido ao seu ofício. A grande maioria dessas pessoas entrou na Colômbia de forma irregular. Os resultados indicam que 93,2% das pessoas pesquisadas não têm o passaporte carimbado, aponta o relatório, elaborado com dados de Barranquilla, Bogotá, Cali, Cúcuta, Maicao e Medellín, com os depoimentos de 600 refugiados venezuelanos.

É o caso de Valentina, que entrou em território colombiano por trilhas ou passos irregulares, com 2 dólares em mãos para ela e uma amiga. Apesar de ter a Carteira de Proteção Temporária do PPT, ele sobrevive graças a trabalhos informais. Eles a contatam por telefone, Facebook ou através de uma página em que ela está cadastrada. Até desconhecidos que, apesar de vê-la suja devido à reciclagem, lhe oferecem até 10 dólares e, não tendo nada para comer, ela concorda sem hesitar.

Embora tenha ouvido falar de máfias que exploram migrantes por meio de atividades sexuais, ela diz que, quando essa oportunidade se apresenta, prefere trabalhar por conta própria. “São pessoas que exploram uns… Fazem-no por necessidade, não para enriquecer os outros”, acrescenta. Ela gostaria de voltar para a Venezuela, tem toda a família lá, mas também sonha em abrir um negócio na Colômbia.

E assim como Valentina, Sandra* nunca pensou que a prostituição seria o caminho para sobreviver. Ele tem 21 anos, nasceu em San Cristóbal e tem dois filhos. Embora tenha medo de contrair uma doença, trabalha para eles, para "dar-lhes um futuro". “Isso me assusta muito porque tenho meus dois filhos e trabalho honestamente para eles”, explica. Chegou à Colômbia com 15 anos. Ela trabalhava em uma banca de venda de verduras, em Cúcuta, onde mora há um ano, mas "por ser venezuelana", afirma que recebia apenas 80.000 pesos (menos de 20 dólares) por semana. Sem outra opção de trabalho, uma mulher lhe ofereceu trabalho em um bar e lá ela começou a "fazer coisinhas… Como trabalhadora do sexo, quer dizer, vendendo meu corpo", diz ela.

Se seu país melhorasse a oferta de emprego, ele voltariia, mas, por enquanto, ela sonha em economizar e montar “uma barraca de cachorro e hambúrguer”, seja na Colômbia ou na Venezuela.

Valentina pensa o mesmo. Se houvesse uma oportunidade melhor, ela não hesitaria em mudar de profissão, pois diz que, com a reciclagem, ganha entre 25.000 e 40.000 pesos (entre 3 e 6 dólares) e como profissional do sexo consegue arrecadar entre 10 e 17 dólares por dia.

Violência e doenças

Para Valencia, diretor da Aid for Aids, um dos fatores mais preocupantes é “a profunda violação dos direitos dessas populações”, já que não conseguem encontrar outros meios para sobreviver. Ele ainda diz que essas pessoas enfrentam violência de todos os tipos, sexualmente, fisicamente e emocionalmente. De acordo com o estudo, quase 4,4% afirmaram ter HIV. Valencia afirma que “muitas delas não têm acesso a tratamento ou informação”.

Apesar de se dedicarem ao trabalho sexual e não terem outra forma de sobreviver, 91,4% das pessoas entrevistadas pretendem permanecer na Colômbia. Valencia destaca que se trata de uma população violentada em muitas frentes: migrantes, alguns com orientação sexual diferente e alguns com doenças sexualmente transmissíveis.

É o caso de Sasha Sánchez, uma mulher transexual que também foi infectada pelo HIV. Ela lembra que “naquele momento em que já estava com fome e deitada”, resolveu vender o corpo por dinheiro. Esta venezuelana de 26 anos chegou à Colômbia há 3 anos com a esperança de se submeter a algumas cirurgias, mas, como ela diz, embora tudo parecesse "rosa, não era assim". Ela não conseguiu um emprego estável e sofreu discriminação. Apesar de conhecer todas as habilidades de cabeleireira e estilista, chegou um momento em que o dinheiro não era suficiente e ela decidiu se prostituir. “Já vendi doce, mas mais que tudo, trabalhei na prostituição. Eu sinto que a prostituição é a saída mais rápida", disse ele.

Já morou em Bogotá, Cúcuta, Cali, Bucaramanga e Pamplona, ​​mas Medellín é sua cidade preferida, onde sonha em abrir seu próprio salão de cabeleireiro, apesar de não possuir documentos adequados. Antes, ajudava a mãe a limpar as casas da família, mas teve de migrar em busca de "um futuro melhor". No entanto, confessa que já foi vítima de abusos e ainda se lembra de ter sido espancada e maltratada, mas mesmo assim diz que sua situação melhorou em relação a quando chegou a Medellín: “Eu não me importava com o que eles iam me dar… Eu disse a ele… 'dê-me comida, eu quero comida'. Eu não me importava com nada, só estava com fome".

Sánchez pensou em se aposentar da prostituição. Desde que contraiu o HIV, confessa que foi acometido de "fobia sexual" e, embora diga que está de boa saúde, sabe que quer mudar de vida “desde que nos aceitem”, disse.

Embora o estudo tenha sido feito na Colômbia, o diretor da Aid for Aids aponta que em outras partes da região a situação pode ser semelhante, com muitos migrantes praticando "sexo de sobrevivência". Liz Lizama, porta-voz da OIM, disse à VOA que “os contrabandistas continuam a explorar migrantes e pessoas em situações vulneráveis, espalhando desinformação sobre rotas e fronteiras migratórias e deixando as pessoas em situações muito vulneráveis”.

Na Colômbia, migrantes em situação irregular têm problemas para conseguir um emprego estável ou abrir um negócio, pois não possuem os documentos necessários para optar por essa opção. Alguns deles dizem que também sofrem discriminação ou recebem muito pouco apenas por serem venezuelanos.

Nota: os nomes (*) foram trocados para mantar a privacidade dos entrevistados.

Fontes