14 de junho de 2020

Email Facebook Twitter WhatsApp Telegram

 

Soldados franceses em Kigali, Ruanda, em agosto de 1994

O pesquisador François Graner obteve do Conselho de Estado o direito de consultar os arquivos de François Mitterrand, presidente da França durante o genocídio dos tutsis na Ruanda em 1994. O pesquisador, especialista no papel da França durante esse período, já havia enfrentado a recusa da justiça e do ministério em poder estudar os arquivos classificados como secretos.

Esses documentos, agrupando as notas dos assessores do presidente e os relatórios das reuniões do governo, estão guardados no Arquivo Nacional há 25 anos e devem continuar sendo secretos pelo menos até 2055 (prazo de 60 anos após a assinatura). Mas, após cinco anos de batalha judicial, o Conselho de Estado acaba de validar o pedido.

“O pesquisador tem interesse legítimo em consultar esses arquivos para alimentar sua pesquisa histórica e, assim, informar o debate sobre uma questão de interesse público".

Genocídio em Ruanda

De 1918 a 1962, Ruanda estava sob o controle da Bélgica. A sociedade estava dividida entre hutus (84% da população), principalmente camponeses, e tutsis (15% da população). Os colonos belgas contavam com os tutsis para governar, o que exacerbou as tensões entre os dois grupos étnicos.

Os hutus retornaram ao poder na época da independência de Ruanda em 1962 e mataram 10 mil tutsis. 300 mil outros foram forçados ao exílio e tentaram retornar em outubro de 1990; é o começo da guerra civil. Já em 1993, as Nações Unidas já falavam em "limpeza étnica", mas o genocídio realmente começou em 6 de abril de 1994, quando o presidente de Ruanda morreu em um ataque contra seu avião.

A Organização das Nações Unidas dirão mais tarde que esse genocídio causou pelo menos 800 mil mortes de tutsis no espaço de 3 meses e 10 dias.

O que podemos aprender com esses arquivos?

O papel que a França pode ter desempenhado nesse genocídio ainda é muito questionável. Muitas dúvidas permanecem, em particular na criação do novo governo que foi formado dentro da embaixada da França em Kigali, capital de Ruanda, após o ataque.

A França também reconheceu imediatamente esse governo e até convidou seu Ministro de Relações Exteriores ao Palácio do Eliseu em 27 de abril de 1994, quando os massacres já haviam começado. Mitterrand estava ciente da situação no país, porque as notas de seu embaixador e da Direção Geral de Segurança Externa já falaram em 1993 de "limpeza étnica".

A outra questão diz respeito às pessoas responsáveis pelo ataque contra o presidente em exercício. Testemunhas disseram que soldados franceses, que estavam no local do acidente 15 minutos depois, teriam encontrado a caixa preta do avião, mas nunca falaram disso. Outra dúvida é a atuação do exército francês, quando ele poderia ter salvo 2 mil tutsis durante a Operação Turquesa, mas decidiu não fazer.

Por fim, muitos pesquisadores, como François Graner, farão perguntas sobre o voo dos genocidas em julho de 1994 no Zaire, porque este passou por uma área controlada pela França, a "zona humanitária segura".

Todas essas perguntas podem não ter respostas claras com a abertura dos arquivos, diz o pesquisador. O Ministério da Cultura francês tem agora três meses para abrir seus arquivos.

Fontes