17 de junho de 2016

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Antecedentes

Era junho de 2008 quando Hermes Magnus, empresário metalúrgico de Londrina/PR, resolveu buscar investidores que pudessem ajudar sua empresa a expandir os negócios e a lidar com a crescente demanda de mercado. A Dunel Indústria e Comércio Ltda, criada em 2004, era pioneira no Brasil no segmento de equipamentos que testam a qualidade de produtos, um setor que ainda não tem atenção do país.

Sem conseguir financiamento pelo BNDES, Magnus foi atrás de fundos de investimento que topassem colocar pequenas quantias em sua empresa, em troca de rentabilidade sob os lucros. Logo encontrou um interessado: José Janene, ex-presidente do Partido Progressista na Câmara dos Deputados e então réu do Mensalão. O político de 53 anos era um dos sócios da GDF Investimentos, empresa de financiamentos com base no Paraná, e topou conversar com o empresário.

No primeiro encontro, Magnus foi apresentado ao outro sócio, o doleiro Alberto Youssef. Descobriu que os parceiros haviam topado o financiamento e que, logo mais, ele receberia R$ 15 mil para investir na sua empresa. O dinheiro veio em notas, dentro de um envelope branco, entregue em mãos. O empresário estranhou a política, mas, contratos assinados, não poderia se desfazer do negócio tão cedo.

À medida que a parceria se consolidava, Magnus começou a desconfiar que sua empresa poderia estar no meio de um esquema de corrupção. Quando, depois de um encontro na casa do doleiro, teve a confirmação de que precisava, decidiu repassar seus e-mails e conversas telefônicas com os representantes da GDF ao Ministério Público Federal. Estava iniciada a Operação Lava Jato, a maior investigação de âmbito federal da história do país.

A Polícia Federal começou a trabalhar publicamente em cima do caso no dia 17 de março de 2014, na primeira fase ostensiva do processo. O início das prisões temporárias e preventivas encarcerou 17 pessoas, entre elas o doleiro Youssef.

A partir deste episódio, 49 delações premiadas e 133 mandados de prisão cumpridos, a 13ª Vara Federal Criminal, em Curitiba, segue as pontas soltas que faltam, aproximando-se da resolução de um dos crimes mais citados, porém ainda não comprovados: a corrupção em doações de campanha por empresas privadas.

A prática, extinta em setembro de 2015 pelo Superior Tribunal Federal, foi citada por réus vindos das empreiteiras nacionais, personagens principais no escândalo envolvendo a corrupção dentro da Petrobras, como canais para lavagem de dinheiro e para cobrança de favores. Em fevereiro deste ano, mensagens trocadas entre Benedicto Barbosa Silva Júnior, presidente da Odebrecht Infraestrutura, e Marcelo Odebrecht, presidente do grupo, deram a entender que o líder do PSDB, Aécio Neves, teria recebido dinheiro para sua campanha eleitoral de 2014. Em nota, a assessoria do partido alegou que as doações foram registradas no Tribunal Superior Eleitoral.

Motivações para mudanças nas regras de doação para campanhas políticas

A decisão do STF de proibir a doação de empresas privadas para campanhas eleitorais foi baseada no entendimento de que as contribuições privadas contrariam princípios da constituição. Os ministros a favor da decisão, um total de 8 dos 11 que compõe a Casa, alegam que é necessário um distanciamento entre o poder econômico e as decisões políticas.

Assim como Aécio Neves, outros políticos que participaram das eleições de 2014 receberam doações de empresas privadas. De acordo com um estudo realizado pelo jornal Estadão, 360 deputados dos mais de 500 eleitos foram financiados por grandes grupos empresariais. Isso significa que cerca de 70% dos eleitos tiveram doações de empresas envolvidas em sua campanha.

O alto número de deputados que receberam contribuições de dinheiro empresarial para o financiamento de suas campanhas revela a proximidade apontada pela maioria dos ministros do STF durante a votação. Além da proximidade, Alex Hilsenbeck, cientista político, aponta a relação entre a doação de campanha e a corrupção no país. “Escândalos de doação que envolve propinas demonstram que essa corrupção envolve empresários e políticos.”, afirma.

Em relação a isso, Luiz Fux, ministro relator da ação pelo fim da doação de empresas para campanhas, declaração ao portal G1, em 2015, a necessidade do rompimento com a prática das doações. De acordo com ele, “chegamos a um quadro caótico, em que o poder econômico captura de maneira ilícita o poder político”.

Novas regras para doações em campanhas

Com a mudança nas regras de doação, a empresas terão que, a partir das próximas eleições municipais em 2016, atender a algumas exigências segundo a Lei nº 13.165.

Uma das principais modificações foi que os políticos deixarão de receber o dinheiro da doação de campanha diretamente. Nas novas regras, o partida político terá que abriu uma conta exclusiva para que o dinheiro seja depositado.

Ainda segundo a Lei nº 13.165: As doações de recursos financeiros somente poderão ser efetuadas na conta do partido político por meio de: I - cheques cruzados e nominais ou transferência eletrônica de depósitos; II - depósitos em espécie devidamente identificados; III - mecanismo disponível em sítio do partido na internet que permita inclusive o uso de cartão de crédito ou de débito e que atenda aos seguintes requisitos: a) identificação do doador; b) emissão obrigatória de recibo eleitoral para cada doação realizada.

As doações feitas através de recibo assinado pelo doador não podem ultrapassar um valor de 10% dos rendimentos brutos do ano anterior à eleição. Caso esta regra não seja respeitada, o doador deverá pagar uma multa com um valor de cinco a dez vezes a quantia ultrapassada.

Possibilidades de estruturação para evitar casos de corrupção

Hilsenbeck, assim como os ministros do STF, acredita que o fim da doação de campanha é um avanço positivo para a questão da democracia no país. Segundo ele, existem dados apontando que após o início das ações da operação Lava Jato – cerca de 90% dos contratos entre empresas que financiavam campanhas e atores políticos. “Isso revela certa promiscuidade em relação às contas públicas e o envolvimento de empresas em ações financeiras e políticas”, diz.

Assim como o cientista político, Paulo Valadão, empresário, concorda com o fim de doações de campanha por parte de empresas. Ele ainda sugere possíveis estratégias para que os partidos consigam captar recursos de forma benéfica ao processo eleitoral. ”Cada partido político deveria se organizar e cobrar ou mensalidade, fazendo campanha com esse dinheiro. Isso melhoraria o nível das campanhas, baixaria demais o custo e as campanhas não ficariam dependentes de estratégia de marketing que hoje em dia são mais importantes que o discurso politico”, afirma o empresário.

De acordo com Hilsenbeck, uma solução para acabar com os esquemas de corrupção que envolve doação seria a reforma política que consiga colocar limites às doações de pessoas físicas e jurídicas. “Além disso, as instituições fiscalizadoras que combatem essas formas de propina deveriam ter maior autonomia e capacidade de intervenção”, defende.

Fontes