29 de julho de 2024
A transferência de dados pela internet depende da capacidade de navegação de embarcações e da competência de sua tripulação para realizar o comissionamento, suporte e reparo de cabos no fundo do mar. Quando um cabo se quebra, a conectividade é perdida.
Esse fato foi reafirmado pelas embarcações Léon Thévenin e CS Sovereign que precisaram de quase 60 dias para concluir o reparo de cabos submarinos e restabelecer a infraestrutura de conectividade à internet que afetou gravemente a África Ocidental e a África do Sul.
Embora o acesso à internet ocorra por meio de redes móveis, satélites ou cabos terrestres de fibra ótica, o intercâmbio global de tráfego de dados depende desses sistemas de cabos submarinos, compostos de 600 cabos ativos.
Em 14 de março, os cabos submarinos West Africa Cable System (WACS), Africa Coast to Europe (ACE), SAT3, e MainOne falharam. As falhas resultaram de cortes físicos próximos à Costa do Marfim e Senegal, relatou a Main One Service, empresa responsável pela operação de um dos cabos. As investigações preliminares sugerem que a atividade sísmica no fundo do mar pode ter sido a causa dos cortes.
Seguindo as falhas, o regulador de telecomunicações de Gana, um dos países afetados, declarou que o sistema de cabos submarino perdeu entre 90% e 100% da sua capacidade de transmissão.
O relatório publicado pela Internet Society mostra que as falhas afetaram o acesso de 13 países africanos localizados na costa da África Ocidental: Benim, Burquina Faso, Camarões, Costa do Marfim, Gâmbia, Gana, Guiné, Libéria, Namíbia, Níger, Nigéria, África do Sul e Togo. Consequentemente, houve degradação do serviço e indisponibilidade quase total de internet. Além disso, os dados de roteamento da internet recuperados da África pelo projeto de detecção e análise de interrupções na internet (IODA) do Instituto de Tecnologia da Geórgia coincidem com os da Internet Society.
A empresa de pesquisa em telecomunicações, TeleGeography, registrou que, em média, ocorrem 100 falhas por ano em cabos submarinos em todo o mundo. Também explica que raramente se ouve falar sobre isso, visto que na maioria dos casos as empresas de internet distribuem suas redes em cabos diferentes, sendo que, se um deles quebra, a rede permanece funcionando por meio de outros cabos enquanto aquele é reparado.
Na África há situações desiguais. A antropóloga Jess Auerbach, que estuda a infraestrutura de conectividade no país, contou ao The Conversation que:
“ | Os cabos de fibra óptica literalmente circundam a África, apesar de algumas partes do continente possuírem melhor conexão do que outras. Isso se deve aos importantes investimentos feitos por organizações públicas e privadas nos últimos dez anos.
De acordo com um mapa interativo de cabos de fibra óptica, a África do Sul está claramente situada em uma boa posição. Quando as rupturas ocorreram, a rede ficou indisponível por algumas horas antes de o tráfego ser redirecionado; um processo técnico que depende da existência de rotas alternativas e acordos corporativos em vigor para permitir o redirecionamento. É o mesmo que dirigir usando o Google Maps. Se houve algum acidente na estrada, ele encontra outro caminho para chegar ao seu destino. Porém, em diversos países africanos, incluindo Serra Leoa e Libéria, a maioria dos cabos não possui ramificações (o equivalente a saídas de acesso em rodovias), então há entrada de somente um cabo de fibra óptica no país. O tráfego de internet desses países praticamente para quando o cabo quebra. |
” |
Jess Auerbach |
O Comitê Internacional de Proteção ao Cabo (ICPC) aponta que os danos causados aos cabos por deslizamentos de terra ou terremotos representam menos de 10% das falhas registradas. As causas também incluem acidentes com barcos pesqueiros e o impacto de arrastar suas âncoras, que representa dois terços de todas as falhas. Podem ocorrer, com menos frequência, por conta de sabotagem intencional ou mordidas de tubarão.
O Léon Thévenin partiu da Cidade do Cabo para a Costa do Marfim, onde atracou em 29 de março para consertar o cabo SAT-3. Os reparos no cabo ACE foram concluídos em 17 de abril, no WACS em 30 de abril e, finalmente, no MainOne em 11 de maio.
Auerbach diz que “estes são técnicos e artesãos excepcionalmente capacitados que recuperam e reparam cabos, algumas vezes em profundidades de vários quilômetros debaixo d'água”.
Uma das tendências atuais que a pesquisadora destaca é que o financiamento dos cabos costumava ser uma combinação de associações públicas e privadas, mas são atualmente financiados por grandes empresas privadas como Alphabet, Meta e Huawei. “Isso traz graves implicações para o controle e monitoramento da infraestrutura digital”, ela destaca. Isso significa um perigo em potencial para a soberania digital.
Manter a conectividade global com a internet depende diretamente da capacidade destes barcos para realizar navegações costeiras, bem como do conhecimento e habilidade de suas tripulações, que garantem a navegação e manutenção dos cabos submarinos que distribuem o tráfego de internet pelos mares.
Fontes
editar- ((pt)) Jacobo Nájera traduzido por Bárbara Pereira Peixer. As tripulações marítimas que mantêm a África conectada à internet — Global Voices, 26 de julho de 2024
Esta notícia é uma transcrição parcial ou total do Global Voices. |