17 de junho de 2016
A nova velocidade nas marginais Pinheiros e Tiete gerou debates em diversas esferas da sociedade. Hoje, já é possível vislumbrar consensos.
São Paulo é uma das cidades mais populosas e movimentadas do mundo, com o número de veículos só na capital batendo a marca dos 8 milhões. Com tantos automóveis, a quantidade de acidentes é altíssima, e foi pensando nesse problema que a Prefeitura de São Paulo implementou a redução da velocidade em duas das áreas mais movimentadas da cidade: as marginais Pinheiros e Tietê.
A medida consiste na redução do limite máximo de velocidade de 90 km/h para 70 km/h nas pistas expressas (veículos leves), de 70 km/h para 60 km/h na central da marginal Tietê e de 70 km/h para 50 km/h nas pistas locais.
Colocada em prática em julho de 2015, a decisão dividiu a opinião da população. Setores da sociedade acreditam que a Prefeitura não está certa em impor uma regra que vá mexer tanto com a vida dos cidadãos desta maneira sem antes consultá-los.
"Em agosto do ano passado, a OAB entrou com uma ação na Justiça Estadual contra a medida da prefeitura, mas a Justiça Estadual alegou incompetência para tratar do questionamento. Na prática, isso quer dizer que o órgão não se sentia na condição de julgar o caso, colocando-o nas mãos dos juízes federais. Ou seja, da Justiça Federal. De acordo com a Lei, nada de errado na ação da OAB”, explica a advogada Denize Roza sobre os acontecimentos do ano passado. Atualmente, a ação se encontra em competência estadual, aguardando a sequência do processo.
Por outro lado, como mostram os estudos realizados pela CET (Companhia de Engenharia de Trágefo), SPTrans, Prefeitura e pela Secretaria Municipal de Transportes de São Paulo, a redução na velocidade visa a diminuição nos acidentes, como já apresentado e comprovado em outros países pelo mundo.
João Cucci Neto, professor de Engenharia de Tráfego da Universidade Presbiteriana Mackenzie, reforça a importância da mudança. “Isso não é uma novidade que foi criada em São Paulo, isso é uma tendência mundial. Se olharmos para outros lugares do mundo, principalmente na Europa, veremos que esse pensamento está se espalhando de maneira muito rápida. Todos chegaram a conclusão de que esta é a saída porque dá resultados”.
De acordo com o pensamento do professor João Neto está também o da engenheira Athanasía Michalopoulos, especialista em Planejamento e Mobilidade Urbana e em Gestão e Normatização em Trânsito de São José dos Campos, que mostra que ver na redução da velocidade um problema pode significar, de certa forma, um atraso. "A tendência mundial é essa. A de que não se tenha em áreas urbanas velocidades acima de 50 km/h. A sua percepção e o tempo resposta para fazer uma frenagem, para tomar uma decisão, acaba sendo alta se você está numa velocidade baixa", afirma Athanasía.
Um dos intuitos dentro da questão da redução da velocidade é que haja uma reeducação do motorista e que ele tenha consigo a consciência sobre o veículo que dirige e o poder que ele lhe da. "A responsabilidade não esta somente com os órgãos de trânsito, mas sim também com o condutor, que está, muitas vezes, com uma arma na mão, se ele não souber usar.", acrescenta a engenheira. O fato de que foi preciso ir além das medidas apenas imediatas para que surgissem resultados nunca agradou a sociedade, mas, até o momento, segundo dados, só ocorreram melhorias.
"O dano material e o dano pessoal diminuem", é o que diz Athanasía, explicando que a medida foi rejeitada a principio devido ao fato de que a sociedade não estava pensando ou visualizando o plano coletivo que a redução trouxe com ela.
Os números positivos "reverteram, de uma certa forma, uma ação que inicialmente foi negativa para os usuários", mostrando que tudo tenha sido, talvez, apenas uma questão de adaptação e que a tendência, se houver uma comunhão do poder público, agentes de trânsito e sociedade, é apenas melhorar.
Parte do argumento apresentado pela OAB-SP contra a redução cita a questão dos atropelamentos nas pistas das marginais. O órgão acredita que mesmo com tamanha redução da velocidade, tais acidentes continuaram a acontecer. O professor João Cucci Neto acredita que existam medidas que possam ser tomadas, em conjunto com a redução, para que este problema seja solucionado, mas enfatiza que talvez este não seja o caminho. “A segurança de trânsito tem este problema. As pessoas querem resolver problemas que nem sempre são do trânsito com medidas que dizem respeito a isso. Os indigentes que circulam por ali são uma questão social que precisa ser resolvida com tratamentos sociais e não de engenharia de tráfego”.
O incômodo gerado em algumas pessoas pela nova regra adotada pela Prefeitura poderia ter motivado outras ações, como explica a advogada Denize Roza. “Precisaria ser movido por um coletivo, quem pode questionar as ações do poder público é o próprio povo ou um coletivo. As ações teriam que ser preparadas e ingressarem na Justiça nas varas da Fazenda Pública da capital. Ou seja, isso poderia sim ter sido feito por outro que não a OAB”.
No mês seguinte à ação movida pela OAB tornar-se conhecimento público, o próprio prefeito Fernando Haddad se manifestou e disse que o diálogo era difícil e os argumentos do órgão sem fundamento. Atualmente, não há mais margem para uma alteração na norma aplicada pelo prefeito, já que os resultados foram satisfatórios.
Por mais controvérsias que a decisão da Prefeitura possa ter gerado, as consequências dela tem sido bastante positivas. Aliada a outras medidas, como a ampliação dos corredores de exclusivos para ônibus e a mudança na mão de algumas vias, a cidade apresentou uma melhora nos níveis de congestionamento. Caiu 51 posições no ranking mundial, onde antes se encontrava em 7° lugar. Comparada com outras 258 metrópoles mundiais com mais de 800 mil habitantes, São Paulo encontra-se em 58°.
Já os índices de acidentes também vem melhorando. As medições mais recentes, feitas em setembro de 2015, mostram que os acidentes com vitimas nas marginais tiveram redução de 36%. O objetivo da mudança parece ter sido atingido, além de diminuir um incomodo tão grande na vida dos paulistanos: a demora no trânsito.
Fonte
- Jilmar Tatto. O valor de uma vida — Fôlha de São Paulo, 1 de agosto de 2015
- Jilmar Tatto. O valor de uma vida — pt.org.br, 1 de agosto de 2015
- Marcos da Costa. Solução midiática — Fôlha de São Paulo, 1 de agosto de 2015
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