9 de abril de 2023
A origem de um dos pratos mais populares da culinária sul-americana, a arepa, tem sido motivo de polêmica entre Venezuela e Colômbia. Tanto colombianos quanto venezuelanos afirmam ser os criadores deste prato, considerado parte essencial da cultura culinária de ambos os países.
Mas quem realmente inventou a arepa? É complicado determinar suas origens e para isto é preciso voltar ao ano de 1492, quando Cristóvão Colombo descobriu o continente americano. A essa altura, cronistas e dados arqueológicos indicam que a arepa já existia e que os indígenas a preparavam com o "grão de ouro", moldando-a em forma plana e redonda. “No nosso caso, os primeiros registros da arepa são posteriores à terceira viagem de Cristóvão Colombo, depois de 1498, data em que Colombo chegou pela primeira vez ao continente quando pisou nas costas orientais da Venezuela, especialmente nas costas de Paria.” , disse Ocarina Castillo, antropóloga da Universidade Central da Venezuela e autora do livro “Los panes de esta tierra”.
A especialista disse que os indígenas Cumanagotos que viviam no leste da Venezuela durante a conquista espanhola o chamavam de "erepa". Embora esses dados apontem para uma origem venezuelana, a antropóloga explica que essa interpretação é principalmente linguística. “Se Cristóvão Colombo tivesse desembarcado alguns quilômetros antes ou alguns quilômetros depois, teria sido alcançado não por Cumanagoto, mas por indígenas de outra cultura e com outra língua, que chamariam de outra coisa”, disse a antropóloga.
Castillo explica que “a arepa existe desde antes de nossos países existirem. Antes de existirem nossos limites, antes de existirem nossas sociedades. O importante da arepa é justamente ser um alimento ancestral”.
Por outro lado, o antropólogo colombiano Weildler Guerra Curvelo, que foi governador de La Guajira, disse que a arepa era consumida na região antes mesmo da existência de fronteiras. “Aqui estamos falando de um alimento com milhares de anos. Essa comida já foi encontrada pelos espanhóis aqui e tem séculos. Era a alimentação básica dos indígenas”, disse.
“Alimentos como o milho na América Central, na América do Sul, foram fundamentais por meio de muitos derivados, mas a culinária indígena nos mostra que esse tipo de produto já existia, que já existia antes da chegada da população europeia e africana ao território americano (...) Estamos falando de algumas invenções humanas muito longínquas”, acrescentou Curvelo.
O papel da diáspora venezuelana
Segundo dados oficiais da migração colombiana, esse país acolheu o maior número de migrantes venezuelanos no mundo, com um número estimado de 2,48 milhões. Esse fenômeno migratório, segundo alguns especialistas, intensificou o debate sobre a origem da arepa. Segundo Castillo, “esse interesse recente e muito renovado pela arepa tem muito a ver com a diáspora venezuelana”.
“Como na migração, na mala cada um de nós leva sua memória, seus ingredientes, suas preparações e também os elementos de sua memória sensorial que são mais importantes para ele. De fato, os venezuelanos migrantes levaram em sua mala seu amor pelo arepa”, acrescentou.
À medida que os venezuelanos começaram a migrar para a vizinha Colômbia, eles também perceberam a grande importância desse prato para os colombianos.
Curvelo observou que a diversidade de arepas na Colômbia "é muito grande". “Sou de La Guajira e aqui posso estabelecer cinco tipos de arepas, para dar exemplos, arepas de milho roxo, arepas de milho amarelo e arepas de milho branco”, disse.
Embora seja difícil determinar com certeza de que país é originária a arepa, é claro que a Colômbia e a Venezuela não são os únicos que consomem o produto ou similar.Existem vários pães feitos de milho, explicou Castillo, alguns achatados e outros redondos. Entre os planos estão tortillas em toda a América Central, com suas variantes, disse ele. "Pensemos apenas no México, na quantidade de tortillas diferentes que existem e na quantidade de variedades de milho. E como não poderia ser assim, toda a América é filha do milho, que está difundido em todo o nosso continente", disse Castillo disse.
Ambos os especialistas concluem que o importante é que a arepa é uma embaixadora das diversas culturas hispânicas e serve para fortalecer os laços entre os países por meio das semelhanças. “A cozinha nos une, constrói pontes, não é que passou de um lado para o outro. Entre outras coisas porque nos reconfiguramos territorialmente ao longo do tempo. Esta República não existiu. Havia muitas cidades lá, nesta parte do norte e no Caribe em geral. Fizemos parte da mesma entidade”, explicou Curvelo.
“Acredito que a arepa, no caso binacional da Colômbia e Venezuela, é uma ótima oportunidade para um diálogo de convivência, vizinhança e paz., também nestes tempos tão difíceis que estamos vivendo”, disse Castillo.
Fontes
- La arepa: ¿venezolana o colombiana? De ninguno, dicen los expertos — VOA, 8 de abril de 2023
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