Por que a figura de Cristóvão Colombo se tornou polêmica nos EUA e na América Latina?
15 de outubro de 2024
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Nos Estados Unidos, estátuas de Cristóvão Colombo foram decapitadas, outras foram arrancadas dos seus pedestais durante protestos e, noutros casos, removidas pelas autoridades locais. Estima-se que mais de 40 monumentos erguidos ao navegador genovês, a quem se atribui a descoberta da América, tenham sido removidos.
Algumas cidades latino-americanas também não ficaram para trás: em capitais como Cidade do México e Bogotá, monumentos foram removidos ou foram feitas alterações para contextualizar os significados.
Nos Estados Unidos, Colombo superou até os fundadores do país em monumentos, e hoje o almirante ainda ocupa o terceiro lugar em figuras erguidas em pedestais em todo o país. Os Estados Unidos ainda têm 149 monumentos em pé, de acordo com o Monument Lab e a Fundação Andrew W. Mellon, com Abraham Lincoln em primeiro lugar com 193, e George Washington com 171.

- Quando e por que Colombo adquiriu tanta relevância nos EUA e na América Latina?
O historiador Héctor Lindo, professor emérito da Universidade Fordham, em Nova York, explica à Voz da América que o engrandecimento de Cristóvão Colombo no continente ocorreu de duas maneiras.
Nos Estados Unidos ganha destaque ao comemorar o quarto centenário da chamada “Descoberta da América”, que atualmente é reconhecida como “O encontro” das culturas pré-hispânicas com o mundo europeu, com Colombo e suas viagens.
Mas por trás do crescente interesse dos Estados Unidos em glorificar o feito de Colombo e elevá-lo a pedestais, a diáspora ítalo-americana esteve muito envolvida, tentando alcançar notoriedade medindo as contribuições da Itália no Novo Mundo.
“Quem mais se interessou foram as comunidades italianas; Eles identificaram Cristóvão Colombo como italiano numa época em que aquela comunidade era marginalizada e precisavam mostrar à população dos Estados Unidos que a Itália contribuiu muito”, explica Lindo.
Na América Latina, o impulso à figura de Colombo veio mais tarde, devido a um acontecimento traumático para o reino espanhol, já em declínio, quando perdeu a guerra com os Estados Unidos em 1898, na qual Cuba, as ilhas Filipinas, Porto Rico e outros territórios foram removidos do seu domínio.
Segundo Lindo, a Espanha começou no início do século XX a promover o associativismo na região latino-americana - que via como uma esfera de influência - devido à sua identificação com a hispanicidade, o que mais tarde levaria ao reconhecimento do dia 12 de outubro como o Dia de Colombo.
“Dar relevância à relação da Espanha com os países latino-americanos foi contrariar o declínio espanhol após a Guerra Hispano-Americana, que foi um trauma tremendo e um pouco para recuperar a sua presença internacional na América Latina”, explica o historiador.
O plano teve muito eco nos países latino-americanos, que viam com medo a nascente potência do Norte “por causa da agressividade anglo-saxónica” após a guerra em Cuba. Mais tarde, com a intervenção dos EUA no Panamá, a ocupação do Haiti e as tentativas de dominar a Nicarágua, “um movimento começou a identificar-se com o hispanismo e com o papel de cristianização que a Espanha tinha desempenhado”.
- O que levou à reflexão da data?
Os movimentos sociais pelo reconhecimento das minorias e dos direitos civis cresceram ao longo do século XX, tendo um ponto de viragem na década de 1960, o que levou a discussões mais amplas sobre grupos que foram marginalizados como efeitos da colonização que se seguiu às viagens de Colombo.
Entre estes, destacam-se o passado de escravidão da comunidade afro-americana nos Estados Unidos e a desapropriação dos povos indígenas na América Latina, mesmo quando em alguns países da região as populações constituem, até hoje, a maioria em casos como Guatemala, Peru, Bolívia, entre outros.
Isto levou historiadores como David M. Perry a considerar a questão de reavaliar a celebração da data, que nos Estados Unidos foi instituída em 1898, embora só em 1937 tenha sido acrescentada aos feriados a nível federal.
Perry publicou em artigo especializado que, embora seja destacado o “inegável impacto histórico” do feito de Colombo com sua chegada à América, esse fato “causou a grande era de exploração no Atlântico, comércio e colonização pelos europeus”, com o. o comércio de escravos como uma das maiores crueldades aos olhos do presente.
Não é de surpreender que durante os protestos do movimento Black Lives Matter em 2020, após a morte de George Floyd pelas mãos de policiais brancos, os manifestantes carregaram sua fúria contra monumentos como os de Cristóvão Colombo, sem levar em conta o histórico ou valor artístico das peças.

Um dos mortos nesses protestos foi a escultura de Colombo na cidade de Baltimore, perto de Washington, considerada a primeira erguida ao navegador genovês no mundo. Datava de 1792.
- É uma solução mudar o nome da celebração?
A mudança do nome da celebração é uma iniciativa nos EUA para a qual se registram propostas desde a década de 1970, em que se cogitou a mudança do feriado nacional por um que representasse os povos nativos americanos.
Em 14 estados e cerca de 130 cidades, incluindo o Distrito de Columbia, capital dos EUA, o Dia de Colombo é comemorado juntamente com outra celebração ou totalmente substituído.
Ao chegar à Casa Branca em 2021, o presidente Joe Biden juntou-se ao clamor por uma mudança no feriado e decretou que a celebração também reconhecesse o Dia dos Povos Indígenas.
Biden destacou então a inegável “dolorosa história de erros e atrocidades que muitos exploradores europeus infligiram às nações tribais e às comunidades indígenas”.
- A remoção de monumentos resolve o problema?
O historiador salvadorenho Carlos Cañas Dinarte, radicado em Espanha, disse à VOA que a demolição de monumentos é “uma disputa aberta sobre a história e a memória”, mas que não conduz a soluções e empurra mais para “uma manipulação de sensibilidades”.
Na sua opinião, tais ações “não devolvem direitos aos povos nativos do continente, e a substituição dos monumentos destruídos pelos de chefes renomados também exalta impérios, reinos e senhorios que subjugaram outros ao seu redor, como ocorreu entre os maias, astecas e quíchua”, ressalta.
Cañas acrescenta que a simples eliminação leva à procura de substitutos, pelo que o trabalho dos meios de comunicação e da academia é “difundir mensagens com conteúdos para que cada monumento seja valorizado na sua verdadeira essência” para que “a paisagem pública comemorativa seja propriedade de todos e deve refletem diversos interesses socioculturais.
Um ponto que o historiador Héctor Lindo compartilha é que cada monumento deve ser contextualizado, pelo valor artístico e histórico que pode representar, e a partir daí explicar os momentos em que foram criados, como parte da paisagem urbana das cidades americanas. . e latino-americanos.
Fontes
editar- ((es)) Tomás Guevara. ¿Por qué la figura de Cristobal Colón se volvió controversial en EEUU y Latinoamérica? — VOA News, 14 de outubro de 2024
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