No Brasil, irmão do prefeito assassinado do PT presta depoimento para a CPI dos Bingos
Brasil • 2 de setembro de 2005
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Bingos ouviu na quinta-feira (1) o médico oftalmologista João Francisco Daniel, irmão do prefeito assassinado de Santo André (SP), Celso Daniel, que pertenceu ao Partido dos Trabalhadores (PT).
Celso Daniel foi seqüestrado e assassinado em janeiro de 2002. A família de Celso não ficou satisfeita com o inquérito policial que alegou crime comum e começou a pressionar as autoridades para que o caso fosse reaberto. O Ministério Público reavaliou o caso e pediu à polícia para que o caso fosse novamente investigado. Segundo a opinião presente do Ministério Público, a morte do prefeito está relacionada com um suposto esquema de corrupção para arrecadar fundos para o PT, montado durante o mandato do prefeito Celso Daniel, na prefeitura de Santo André.
Pelo primeiro inquérito policial, contestado pela família de Celso Daniel, o prefeito foi seqüestrado por engano por uma quadrilha de seqüestradores, que ao saber depois da identidade da vítima, com medo, resolveu livrar-se dela. Segundo o primeiro inquérito policial, o chefe dos bandidos mandou soltar o prefeito, mas devido a uma falha de comunicação entre ele com outro integrante da quadrilha, que entendeu a ordem de modo errado, Celso Daniel acabou sendo executado.
João Francisco disse que há vários pontos falhos no primeiro inquérito policial. Ele revelou que segundo o médico legista que fez a autópsia do corpo do prefeito, Celso Daniel foi brutalmente torturado antes de morrer. João Francisco disse que, após grande insistência, conseguiu ter acesso aos documentos e fotos da autópsia e que ele também chegou à conclusão de que seu irmão foi torturado. João Francisco criticou o comportamento do deputado Luiz Eduardo Greenhalgh do Partido dos Trabalhadores (PT), indicado na época pela Câmara dos Deputados para acompanhar o caso. Segundo João Francisco, Greenhalgh descartou de imediato a hipótese de Celso Daniel ter sido torturado antes de morrer.
Entre outras falhas no primeiro inquérito policial, João Francisco Daniel infornou que o suposto assassino do seu irmão (um menor de idade, na época do crime) não conseguiu reconhecer a foto da vítima Celso Daniel, quando esta foi-lhe apresentada por um representante do Ministério Público. Ele afirmou ainda que há uma testemunha que viu o ex-segurança do prefeito, Sérgio Gomes da Silva, conhecido como o "Sombra", chutar seu irmão para fora do carro, no momento do seqüestro.
Segundo João Francisco, todas as pessoas que têm alguma informação sobre o assassinato do prefeito têm medo. Ele informou que até agora pelo menos seis testemunhas foram assassinadas, entre elas Dionísio de Aquino Severo, preso que fugiu de helicóptero de uma penitenciária de São Paulo, mas que foi recapturado depois. Dionísio disse que falaria em juízo sobre a morte do prefeito, contudo foi assassinado dentro do presídio antes de prestar depoimento. O garçom que serviu Celso Daniel na noite do crime é outra pessoa que foi assassinada e a testemunha da morte do garçom também morreu.
João Francisco acredita que a morte de Celso Daniel foi precipitada por causa de um dossiê que ele preparava sobre o esquema de corrupção na prefeitura de Santo André. Segundo João Francisco Daniel, seu irmão Celso Daniel conhecia e era conivente com um esquema de corrupção para arrecadar dinheiro para o Partido dos Trabalhadores (PT). Celso Daniel, segundo João Francisco, descobriu que indivíduos estariam a desviar para eles mesmos o dinheiro do esquema de corrupção que devia ir para o partido. Celso Daniel não teria concordado com essas pessoas e estava preparando um dossiê para poder denunciá-las futuramente. Antes que o prefeito fizesse qualquer outra coisa, ele foi assassinado.
João Francisco Daniel disse: "Nós da família de Celso encontramos um envelope em seu apartamento, que já entregue ao Ministério Público, que continha um organograma e um conjunto de documentos da evolução patrimonial de várias pessoas, dentre elas, Sérgio Gomes da Silva. O envelope contendo esses documentos foi entregue para Celso por Gilberto Carvalho, que já confirmou isso em declaração feita ao Ministério Público".
De acordo com João Francisco, Celso Daniel confidenciou-lhe que como medida de precaução "estava armazenando dados sobre Klinger de Oliveira Souza, Sérgio Gomes da Silva e Ronan Maria Pinto". Para João Francisco, isso reforça a idéia de que Celso Daniel foi morto por causa do alegado dossiê.
João Francisco revelou que há dois processos em tramitação que envolvem o principal suspeito da morte de Celso Daniel, seu ex-segurança Sérgio Gomes da Silva (o Sombra): "Em Santo André tramitam dois processos: um relativo a fraudes em licitação e outro à exigência de pagamento mensal de propina por parte de empresários de ônibus. Em Itapecerica tramita o processo relativo ao assassinato de Celso Daniel. Nesses três processos há um personagem comum: Sérgio Gomes da Silva, já denunciado como mandante do crime por ter participado do seqüestro e que teria pago US$ 40 mil dólares aos seqüestradores".
João disse que chefe do gabinete de Lula sabia do esquema de corrupção
João Francisco Daniel disse que o chefe de gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Gilberto Carvalho, sabia do esquema de corrupção na prefeitura de Santo André, administrada por seu irmão, o prefeito de Santo André assassinado, Celso Daniel.
Segundo João Francisco, em 26 de janeiro de 2002, às vésperas da missa de sétimo dia de seu irmão, Gilberto Carvalho, ele e um outro irmão de Francisco, Bruno, encontraram-se no apartamento de Celso. Ele disse que ouviu o chefe de gabinete de Lula revelar detalhes sobre o esquema de corrupção na prefeitura para arrecadar fundos para o Partido dos Trabalhadores (PT). Segundo João, Gilberto contou que ocorria um pagamento ilegal (propina) feito por empresas de ônibus de Santo André. Segundo Francisco, que alegou ter ficado estarrecido ao ser informado sobre toda a estrutura de corrupção, o principal mentor do esquema era Klinger de Oliveira Souza, então secretário de obras da prefeitura.
João Francisco Daniel explicou como funcionava o suposto esquema de corrupção na prefeitura, que contava ainda, segundo ele, com a participação do deputado e ex-ministro José Dirceu: "O esquema era completado com a ajuda do empresário ligado à coleta de lixo Ronan Maria Pinto, e Sérgio Gomes da Silva, o Sombra, que era o responsável pela arrecadação das propinas. Após o recolhimento do dinheiro, Sérgio pegava o seu Corsa preto e se dirigia de imediato para a cidade de São Paulo, para entregar o dinheiro diretamente a José Dirceu que, na época, era o presidente do PT."
João Francisco informou que Ronan Maria Pinto é o dono da empresa de lixo Rotedale, a qual é acusada num processo em Santo André de falsificar a tonelagem do que de fato coletava. O principal suspeito do assassinato de Celso Daniel é o ex-segurança do prefeito morto, Sérgio Gomes da Silva, conhecido como "Sombra", que tornou-se empresário.
João Francisco, disse que declarou para o Ministério Público, em maio de 2002, que o atual chefe do gabinete do Presidente Lula chegou a levar o dinheiro da corrupção da prefeitura para José Dirceu. Esse dinheiro, segundo ele, seria usado na campanha presidencial de 2002: "Gilberto Carvalho também levava para José Dirceu dinheiro para a campanha presidencial, oriundo de esquemas de corrupção de Santo André".
Após ouvir essas denúncias, o senador José Jorge (PFL-PE) pediu a imediata demissão de Gilberto Carvalho do cargo de chefe de gabinete do presidente da República. O senador Tião Viana (PT-AC) defendeu Carvalho e disse que ele "é um homem digno".
O senador Romeu Tuma (PFL-SP) pediu proteção policial para João Francisco e disse estranhar o fato de o assassinato do prefeito ter sido classificado pelas primeiras investigações como crime comum. O senador Geraldo Mesquita Júnior (PSOL-AC) disse que não acredita que José Dirceu esteja envolvido no assassinato do prefeito Celso Daniel, contudo acusou-o de ser um "grande engenheiro" na arrecadação de dinheiro irregular para campanhas eleitorais.
Os senadores do Partido dos Trabalhadores (PT), Aloizio Mercadante (PT-SP), Flávio Arns (PT-PR) e Tião Viana (PT-AC), disseram não acreditar que Celso Daniel e Gilberto Carvalho estivessem envolvidos no esquema de corrupção da prefeitura de Santo André. João Francisco discordou dos senadores e disse: "Meu compromisso é falar sempre a verdade e esclarecer o assassinato de meu irmão. Estou fazendo meu dever como cidadão brasileiro. Sempre quis e quero justiça".
Pessoas envolvidas contestam João Francisco
O chefe de gabinete da Presidência da República, Gilberto Carvalho, distribuiu quinta-feira (1) uma nota que alega que as declarações feitas a seu respeito por João Francisco Daniel não são verdadeiras.
Segundo a nota de Gilberto Carvalho: "Não afirmei a este senhor, em nenhum momento, que levei qualquer importância em dinheiro ao deputado federal José Dirceu, simplesmente porque nunca o fiz. Fica muito fácil afirmar – e posteriormente apresentar uma testemunha familiar – qualquer coisa a respeito de uma pessoa" .
Gilberto Carvalho disse na nota: "desde o primeiro momento manifestei, por palavras e ações, o interesse de que a verdade prevalecesse, atitude que foi a mesma por parte daqueles que efetivamente estiveram próximos a Celso até o último dia de sua vida".
O empresário Ronan Maria Pinto emitiu uma nota em que desmente as acusações do irmão do prefeito assassinado. Diz a nota:
O empresário Ronan Maria Pinto repudia mais uma vez a tentativa de envolvimento de seu nome e as acusações que lhe foram feitas – sem fundamentos - pelo irmão do ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel, o Dr. João Francisco Daniel, em depoimento hoje, 1º de setembro, na CPI dos Bingos, no Congresso Nacional.
Para o esclarecimento de todos esses fatos e detalhes, o empresário solicita encarecidamente que a imprensa procure conhecer o completo teor das investigações que, a seu pedido, desde julho último, não estão mais sob sigilo de Justiça. Somente assim se poderá evitar que apenas um lado da história apareça, e que tão séria investigação seja transformada apenas em espetáculo de mídia. Os depoimentos prestados e os documentos entregues por ele constantes nos autos demonstram sua total isenção.
Ronan Maria Pinto reitera ainda que, desde 2002, vem sendo vítima de uma espécie de linchamento moral e público sem qualquer base real. E que está convencido que teve seu nome envolvido apenas por contrariar fortes interesses da concorrência, em especial da Família Gabrilli, que sempre pretendeu tirá-lo do mercado onde ele atua e oferece os melhores serviços e atendimento, buscando construir empresas sólidas, transparentes, e que empregam cerca de 2000 funcionários na região.
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Fontes
- Começa reunião para a tomada do depoimento de irmão de Celso Daniel — Agência Senado (Brasil), 1 de setembro de 2005
- João Daniel relaciona morte de Celso Daniel à propina em Santo André — Agência Senado (Brasil), 1 de setembro de 2005
- João Daniel: mais de seis pessoas ligadas ao caso Celso Daniel já foram assassinadas — Agência Senado (Brasil), 1 de setembro de 2005
- Ao final do depoimento, João Daniel reafirma acusações contra Gilberto Carvalho e José Dirceu — Agência Senado (Brasil), 1 de setembro de 2005
- Empresário repudia acusações de irmão de Celso Daniel à CPI dos Bingos — Agência Brasil, 1 de setembro de 2005
- Nelson Motta. Em nota, chefe de gabinete de Lula diz que declarações de irmão de Celso Daniel não são verdadeiras — Agência Brasil, 1 de setembro de 2005
- Ivan Richard. Irmão de Celso Daniel diz que chefe do gabinete de Lula confessou participar de esquema de corrupção — Agência Brasil, 1 de setembro de 2005