Agência Brasil

São Paulo • 13 de julho de 2015

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O Ministério Público Federal (MPF) investiga caso de tráfico de crianças em orfanato da capital paulista, de onde menores teriam sido levados ao exterior e adotados de forma ilegal. Dois antigos administradores do orfanato são réus em ação civil pública ajuizada pelo MPF.

Na sexta-feira (10), a Justiça Federal expediu mandados de busca e apreensão na sede do extinto orfanato Lar da Criança Menino Jesus, na zona norte da cidade, e na residência dos réus. Os documentos podem mostrar outros casos de tráfico ilegal de crianças.

Segundo informações divulgadas hoje (13) pelo MPF, os réus Guiomar e Franco Morselli aproveitaram-se da condição de dirigentes do orfanato “para praticar tráfico internacional de crianças com o intuito de promover adoções clandestinas”. A ação cobra dos réus pagamento de indenização por danos morais e materiais às crianças vítimas do tráfico e também por danos morais coletivos, já que a prática ilícita pode ter comprometido a credibilidade e reputação do país e dos brasileiros no exterior.

Embora exista somente a confirmação de que quatro crianças foram levadas ao exterior pelo casal, informações coletadas pelo MPF e pela Polícia Federal indicam que tal prática era recorrente. De acordo com o MPF, uma das mulheres cujo filho foi entregue a estrangeiros informou à PF que Guiomar acolhia mães solteiras em seu orfanato e depois entregava as crianças a terceiros.

Em 1987, os réus foram responsáveis pela entrega da menina Charlotte Cohen Tenoudji, hoje com 27 anos, a um casal francês. Na mesma época, Guiomar e Franco viajaram à França com o suposto irmão gêmeo de Charlotte, entregue a outra mãe adotiva. No mesmo ano, dois meninos, também supostamente gêmeos, foram levados a Paris e adotados por casais estrangeiros.

A procuradoria afirmou que a maioria dos registros de nascimento das crianças abrigadas no orfanato era falsificada. As mães eram mulheres que trabalhavam na instituição. Além disso, “como testemunhas dos documentos figuravam funcionários, voluntários do orfanato e, às vezes, a própria ré, Guiomar Morselli”.

A existência de irmãos gêmeos também era forjada. Em nota, o MPF informou que, no caso de Charlotte, "a suposta mãe biológica da criança confessou ter declarado ser a mãe por pressão da patroa”. Ainda de acordo com nota, “as investigações mostram que os réus receberam o equivalente a R$ 100 mil pela adoção da menina”.

Segundo o MPF, por recorrer à situação de vulnerabilidade e à aceitação de pagamentos para recrutar, alojar, transportar e transferir as crianças do orfanato, a conduta do casal configurou tráfico de pessoas. Para a procuradoria, no caso da menina Charlotte, os pais adotivos mostraram-se desestruturados e agressivos, sujeitando-a a maus-tratos psicológicos.

Em abril do ano passado, Charlotte prestou depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Tráfico de Pessoas da Câmara dos Deputados. Segundo ela, que voltou a morar no Brasil em 2012, os pais adotivos nunca esconderam que ela não era filha biológica, mas não revelavam as circunstâncias da adoção.

No depoimento, Charlotte declarou que, aos 14 anos, descobriu no escritório do pai uma pasta com documentos revelando sua origem. "Já se passaram 12 anos. Não vou desistir. Algumas pessoas no Brasil conhecem minha mãe e meu pai. Enquanto essas pessoas estiverem vivas, não desistirei. Elas têm de falar.”

A Agência Brasil entrou em contato com o Lar da Criança Menino Jesus, mas nenhum responsável foi encontrado para comentar o inquérito. Guiomar e Franco Morselli também não foram encontrados.

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