Divergências políticas e diplomáticas marcam posse de Lula como presidente do Mercosul
6 de julho de 2023
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assume a presidência temporária do Mercosul na tentativa de destravar o acordo entre Mercosul e União Europeia. Na 62ª reunião dos chefes de Estado do Mercosul, ocorrida em 4 de julho, algumas divergências foram evidenciadas entre os países que compõem o bloco sul-americano e o presidente comentou que a carta que a União Europeia mandou ao Mercosul é inaceitável sob alguns aspectos.
“A retomada do governo petista no caso brasileiro gera uma espécie de desalinhamento no Mercosul, na medida em que o Mercosul passa a ter duas visões distintas, a do Uruguai e Paraguai e da Argentina e Brasil. Há uma certa polarização de visões no interior do Mercosul e, por regra, a União Europeia só negociará com o Mercosul como um bloco, como um todo. E aí vem o problema desse equilíbrio difícil de ser feito com condições distintas, que está acontecendo no interior do Mercosul, e o presidente Lula terá dificuldade de fazer essa harmonização de posicionamentos do Mercosul”, diz Amâncio Jorge da Silva, professor do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP.
- Momento atual
Um dos pontos de conflito é a Venezuela. O presidente do Uruguai cobrou uma posição clara do país sobre manobras do regime venezuelano para as eleições que acontecerão no ano que vem, ao passo que o Brasil se colocou ao lado da Venezuela. “A Venezuela passa a ser o elemento de instabilidade se o Brasil insistir nessa retomada da Venezuela ao Mercosul. Isso acaba impactando essa harmonia que eu comentei e a capacidade de poder de barganha que precisa ficar unificado para negociar com a União Europeia”, explica o professor.
A posição de Lula demonstra insistência também nos termos oferecidos pela União Europeia para o acordo, defendendo que muitos deles são desfavoráveis para o bloco sul-americano. A fala do presidente envolve a defesa de que o Brasil não pode ser eternamente um mero exportador de matéria-prima, minério e petróleo e diz também que precisa de apoio para tentar reativar a indústria nacional.
Silva diz que as visões de ambos os lados estão em jogo: “Era esperado isso, porque o governo, que tem um tom mais à esquerda, vai militar muito mais pelas políticas industriais e denunciar isso que seria um protecionismo europeu. Tem algumas questões contragovernamentais envolvidas, além das questões ambientais, que estão ligadas a essa política industrial, a essa industrialização a que se refere o presidente Lula. Eu diria que os dois lados têm o seu tom preocupados com industrialização e protecionismo, tanto o lado brasileiro quanto o lado europeu”.
Uma das estratégias de negociação é separar os temas ambientais dos temas comerciais para o firmamento do acordo. Para o professor, essa medida é inviável: “Acho muito difícil que se desvincule o meio ambiente do comércio, as políticas da União Europeia estão se tornando mais vinculantes entre comércio e meio ambiente. Acho muito difícil que a solução seja por aí, acho que a questão é realmente o termo do acordo que vai ser trabalhado a ponto das duas partes aceitarem, é um exercício bastante complexo, mas tem perspectiva. Vai depender dessa concessão bilateral”.
Fonte
- ((pt)) Divergências políticas e diplomáticas marcam posse de Lula como presidente do Mercosul — Jornal da USP, 5 de julho de 2023
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