6 de junho de 2024

Painéis fotovoltaicos
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Durante anos, os painéis solares chineses foram reis no Brasil. Em 2022, cerca de 99% de todos os painéis fotovoltaicos adquiridos no Brasil foram importados da China, que é o principal fabricante global de equipamentos de energia solar. Apenas 1 por cento foi produzido localmente. Agora, graças a uma decisão governamental de eliminar uma isenção fiscal que reduzia o custo de importação de equipamentos de energia solar que estava em vigor desde 2020, este cenário pode começar a mudar.

A explicação para esta ampla adoção de produtos chineses é multifacetada. Em parte, isso se deve a razões fiscais: os painéis solares importados da China eram, até recentemente, isentos de impostos de importação, o que os torna 50% mais baratos do que os painéis produzidos internamente no Brasil. Outra razão pela qual os painéis chineses dominaram o mercado brasileiro é a imaturidade do setor local, que não conseguiu se desenvolver na ausência de programas e políticas de incentivo liderados pelo governo.

Os painéis solares chineses não são apenas mais baratos no Brasil. De acordo com estimativas da Comissão Europeia, o custo total da produção fotovoltaica na China é 35% inferior ao da Europa, 20% inferior ao dos Estados Unidos e 10% inferior ao da Índia. E mesmo nos últimos anos, o preço da produção na China continuou a diminuir. Segundo a Info Link, agência de informação sobre energia solar, em 2023, o preço médio dos módulos provenientes da China rondava os 0,25 euros por watt. Pouco mais de um ano depois, no início de Março, esse preço era inferior a 0,1 euros por watt.

Globalmente, a China tem uma forte vantagem em comparação com os fabricantes locais graças à sua cadeia industrial madura – o resultado de mais de 15 anos de investimento no desenvolvimento de tecnologia. O desenvolvimento do sector solar fotovoltaico na China seguiu inicialmente um padrão ascendente e passou por três fases distintas. Primeiro, até 2009, a indústria solar fotovoltaica desenvolveu-se principalmente como uma política de produção orientada para a exportação, com o apoio dos governos subnacionais.

Em segundo lugar, o governo central da China interveio criando mercados solares nacionais para salvar a indústria solar fotovoltaica. Terceiro, a partir de 2015, e com algum sucesso, o governo central chinês começou a remover os subsídios internos e voltou a concentrar-se na eficiência tecnológica, no custo de produção e na integração da rede na sua indústria solar fotovoltaica nacional.

O baixo custo de aquisição de painéis fabricados na China permitiu que países como o Brasil iniciassem a sua transição energética verde. Atualmente, 18,2% da energia do Brasil é obtida por meio de painéis fotovoltaicos. Mas agora isso pode estar ameaçado graças à decisão do governo brasileiro de impor novos impostos sobre as importações chinesas. Isto poderá levar a uma reconfiguração do setor, e não necessariamente positiva.

Sendo uma das fontes de energia mais limpas e de menor impacto, a energia solar está na vanguarda da justiça ambiental. Garantir que os custos dos equipamentos permaneçam baixos significa que a população pode comprar e instalar equipamentos, democratizando assim o uso da energia solar. Também reduz a dependência de outras formas de energia não renovável.

A partir de janeiro de 2024, o governo brasileiro anunciou que está reintroduzindo um imposto de importação de 10,8% sobre os painéis solares chineses. “A produção de equipamentos para geração de energia solar é estratégica para o país”, disse Geraldo Alckmin, vice-presidente do Brasil e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. “Contribui para a nossa segurança energética e está alinhado com o programa de transição ecológica para uma economia de baixo carbono”, afirmou, segundo uma publicação governamental.

A Absolar, Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica, é contra quaisquer novos impostos de importação. “Aumentar os impostos sobre os equipamentos que são usados ​​hoje só encarece a tecnologia para os consumidores, dificultaria o acesso à tecnologia e destruiria, inclusive, os ‘empregos verdes’ que o Brasil tem hoje para quem instala esses sistemas”, disse Rodrigo Sauiaia , presidente da Absolar. Hoje, são gerados cerca de 1,2 milhão de empregos em torno da indústria fotovoltaica no Brasil.

Sauaia acrescentou que os mercados que perseguiram o aumento dos impostos de importação registaram uma redução no desenvolvimento tecnológico e um atraso nas transições para a energia verde porque dificulta o acesso do consumidor final à tecnologia.

Como apoiar a indústria solar nacional? Especialistas no Brasil e na China disseram ao Global Voices durante entrevistas por telefone e online que existem outras medidas potenciais para apoiar a indústria nacional em vez da aplicação de impostos. He Jijiang (何继江), vice-diretor do Centro de Pesquisa para Transição Energética e Desenvolvimento Social da Universidade de Tsinghua, disse ao Global Voices que o governo brasileiro poderia apoiar a localização de “indústrias downstream”, como fábricas para produzir suportes e acessórios, treinar pessoal para montagem e estabelecimento de usinas fotovoltaicas locais de grande escala. Estas medidas também poderão criar empregos locais, acrescentou Jijiang.

Sauaia, da Absolar, disse que um dos primeiros passos a serem dados pelo governo brasileiro seria estabelecer uma política industrial nacional com uma série de incentivos aos fabricantes locais, incluindo uma redução de impostos sobre as matérias-primas necessárias para a produção de módulos fotovoltaicos. Uma segunda medida seria fazer com que o governo adquirisse equipamentos solares de fabricação nacional para instalar em prédios governamentais, como parte de programas habitacionais governamentais e até mesmo em caso de emergências causadas por eventos climáticos extremos, como o do Rio Grande do Sul, sul do Brasil.

Tan Youru, analista fotovoltaico da Bloomberg New Energy Finance (BNEF), acredita que uma queda contínua dos preços na cadeia de abastecimento fotovoltaica pode prejudicar as ambições de muitas regiões de desenvolver a sua produção nacional. De acordo com Youru, apesar dos esforços do governo para promover planos de produção local, haverá pressão devido à descida dos preços, desafiando a rentabilidade das fábricas locais.

He Jijiang afirma que o melhor caminho a seguir é a divisão do trabalho, onde os países desenvolvem diferentes indústrias que complementam a experiência da China na indústria fotovoltaica central. Ele disse que o envolvimento do Brasil na indústria upstream exigiria anos e uma grande quantidade de investimento de capital, o que inevitavelmente atrasaria a transição para a energia verde e aumentaria seus custos.

Fontes

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